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“Um artista cujos pés pintavam obras magníficas em campo”

Pelé à frente, em campo, com a bola nos pés diante de uma multidão ao fundo.

A sua maestria no futebol fez, como poucas vezes em nossa história, o mundo se curvar ao Brasil. Todos reverenciavam, reverenciam e eternamente irão reverenciar a figura de Pelé

Redação: Thiago Viana*/ Revisão e Edição: Paloma Amorim

Há um tempo eu fiz uma matéria no curso da faculdade chamada “História do Cotidiano”, cujo professor é um baita pesquisador e especialista em história do futebol. Durante os quase seis meses em que nos encontramos, eu aprendi a importância desse esporte para movimentos democráticos. Aprendi, também, sobre racismo e futebol, sobre feminismo e futebol. Aprendi sobre como o futebol foi introduzido e popularizado em nosso país.

Falamos sobre grandes clubes, sobre como as partidas eram transmitidas, sobre as crônicas de Nelson Rodrigues. Pude compreender o quanto o futebol molda o nosso próprio país. O quanto o Brasil vive (ou viveu por muitos anos) pelo futebol. Eu, simplesmente, vi todos os meus preconceitos sobre futebol indo por água abaixo.

Nesse curso houve um momento em que o assunto foi Pelé. Impossível falar de futebol, principalmente em nosso país, sem o mencionar. Pelé era genial em campo. Era um artista que com os pés pintava obras de arte magníficas em campo. Era um craque, um atleta de alto nível e que tinha mais do que técnica e disciplina. Ele tinha talento.

Mas sabemos que talento não necessariamente leva as pessoas ao topo. Ainda mais se você vem da base. O que mais vemos por aí são talentos sem reconhecimento. Mas Pelé é o jogador da era da televisão. É o jogador que surge quando as pessoas finalmente podem assistir aos jogos e não somente ouvi-lo pelo rádio ou ler as crônicas no jornal e imaginar as partidas. Pelé surge em um momento em que as pessoas conseguem ver com os próprios olhos as partidas com as quais elas tanto sonhavam. Pelas quais elas tantos torciam. Pelas quais elas tanto vibravam.

Antes dele tiveram, sim, outros gênios, alguns talvez até maiores que ele. Nunca saberemos, pois não há registros imagéticos sobre. Mas como dizer que ele não é o maior se as pessoas o viam sendo o maior? Um talento, um gênio que surge na hora e no momento certo, fazendo com que o mundo olhe para o Brasil com admiração. Na história do nosso país poucas pessoas foram capazes de obrigar o outro a nos ver dessa forma. Os europeus, os norteamericanos, os asiáticos, todos se curvaram ao Pelé. Todos se curvaram ao Brasil. Um homem negro foi uma das poucas pessoas que fez isso em toda a nossa história. E isso é representativo e valioso demais.

Mas como todo ser humano é contraditório, com Pelé não teria como ser diferente. Enquanto o Pelé, o profissional, o artista, o jogador, o atleta crescia, o ser humano Edson Arantes do Nascimento ficava cada vez menor. Foi largamente noticiado pela mídia que Pelé rejeitou sua própria filha, Sandra Regina, fruto de um relacionamento amoroso do atleta com a empregada doméstica Anísia Machado. O Rei, mesmo após a comprovação da paternidade e sabe lá por quais motivos pessoais, optou por rejeitá-la. Até mesmo depois do último suspiro dela, vitimada aos 42 anos por um câncer de mama em 2004, quando o rei já estava na casa dos seus 60 anos. Mesmo em seu leito de morte, ele não a viu. Ele não a quis. Limitou-se a enviar duas coroas de flores ao funeral.

Pelé, a meu ver, era um exemplo de megalomaníaco. Mesmo que sua presença física estivesse ali o tempo todo, havia uma estátua sua dentro de sua própria casa. Pelé tinha noção da sua fama, tinha noção do quanto as pessoas o consideravam grande e o idolatravam. E, em algum momento, ele se perdeu nessa grandeza e começou a ficar pequeno e medíocre. Pode parecer que não, mas é possível ser tudo isso ao mesmo tempo.

De alguma forma, Pelé suscita muitos debates. Ele segue e seguirá sendo ponto de reflexão, questão de discussões. Há quem o defenda, há quem o critique. Eu prefiro ficar na posição de louvar a figura de um grande jogador e rejeitar o ser humano execrável que ele pode ter sido. A gente já fez e faz isso com tantos famosos. Quantos a gente não sabe que eram gênios em suas respectivas áreas de atuação, mas seres reprováveis em suas vidas particulares?

A meu ver, ele não é o maior de todos. Na minha opinião, grande mesmo é aquele que consegue ser um ser humano consciente na mesma medida em que é um esportista (um artista, um cientista, etc) gigante. E aqui eu poderia citar o nome do meu favorito no futebol que causaria muita polêmica, mas não cabe no momento, rs! Mas, mesmo sem o considerar “o maior de todos os tempos” (exatamente por não conseguir ser como ser humano o jogador exímio que era), Pelé é um dos maiores gigantes do futebol, do esporte, da cultura e da história brasileira como um todo. Que já está na história e que seguirá sendo parte dela, reverenciado e debatido tanto pelo povo, quanto por especialistas, dentro dos muros das universidades mundo afora.

*Thiago Viana, 29 anos, homem cis, homossexual, periférico e estudante de História pela Universidade de São Paulo (USP). Ator amador e apaixonado por Teatro, atualmente é professor de Dança e dançarino profissional.

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