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Os Nerds/Geeks da ponte pra cá

Fora a última década, ser nerd nunca foi fácil, ainda mais na periferia, ser nerd era sinônimo de amigo pária. Porem com a ascensão de filmes e jogos cada vez mais inseridos no coração da cultura pop, os nerd viraram o jogo. Em 2014 o Brasil deu um passo gigantesco ao criar a primeira Comic Con nacional, o pionerismo trouxe holofotes para muitas áreas pouco observadas, artistas nacionais finalmente tiveram um espaço e o público brasileiro finalmente esteve próximo de atores e criadores de seus mundos favoritos.

Mas nesse rolê todo teve um publico que acabou a margem. Sim os periféricos, talvez esse distanciamento ocorra por se acreditar não haver afinidade, no entanto essa ideia cai por terra. Seja no grafite ou no Rap, referencias ao universo nerd são sempre constantes.

Então quando em 2019 um grupo de amigos se reunem para criar a perifacon, foi quase como se super-heróis se reunissem para salvar o dia. A ideia do evento contraria o comum e realizará o evento nerd no coração da periferia paulista o capão redondo.

A Perifacon convida público e artistas a se divertirem em oficinas, mesas de debate e o famoso beco dos artistas que também acontece na Comic Con Experience.

SOBRE O EVENTO

O PerifaCon™ é uma iniciativa de amantes de quadrinhos, livros, desenhos e cultura pop no geral que cresceram nas periferias de São Paulo. O evento tem como objetivo levar para a periferia esse universo que historicamente é negligenciado nessa temática. Fomentar a cultura pop, nerd e geek nas periferias de São Paulo, contribuindo
para a quebra de barreiras culturais, promovendo o acesso de marcas e produtores à periferia e vice-versa.

O Jornal Empoderado estará presente cobrindo o evento e também participará de uma mesa de debate sobre arte como resistencia, com os convidados Clarice França *Gibi de Menininha), Veronica Nuvem (Grafiteira), Kljay (Racionais MC´s), Roger beatsjesus (Fanzines). E aproveitamos para bater um papo com Clarice França e Roger Beatsjesus:

Jornal Empoderado – Muito da luta que utiliza arte como protesto está em transcrever um assunto que já é discutido em outras mídias para um ambiente mais cotidiano, atingindo não só o grande público mas como também nichos específicos que muitas vezes não conseguem alcançar esse conteúdo por falta de tempo ou até de interesse. Para você como artista, qual a importância dessa tradução e como é esse processo?

Clarice França – É muito importante que os artistas façam essa tradução. É inevitável que a arte sempre passe alguma mensagem, então saber usá-la como forma de protesto fica cada vez mais necessário, ainda mais no cenário em que estamos atualmente. É uma forma de se expressar, mas também de tentar fazer outras pessoas entenderem a nossa resistência.

Esse processo de tradução vai depender de que mídia está sendo usada. No meu caso, que escrevo histórias, o meu primeiro passo é na temática principal e como isso vai aparecer na conclusão da história. A partir disso, penso em como os personagens vão trabalhar esse tema ao longo da narrativa, como a história vai funcionar ao levantar o tema. Por exemplo, se faço uma história em que quero falar sobre machismo, mas principalmente as dinâmicas de relacionamentos abusivos, eu quero passar uma mensagem final de que esse formato de relacionamento é ruim, mas também quero falar que a vítima não tem culpa, que as agressões não necessariamente são todas físicas, etc.

Roger Beatsjesus – Muito da luta que utiliza arte como protesto está em transcrever um assunto que já é discutido em outras mídias para um ambiente mais cotidiano, atingindo não só o grande público mas como também nichos específicos que muitas vezes não conseguem alcançar esse conteúdo por falta de tempo ou até de interesse. Para você como artista, qual a importância dessa tradução e como é esse processo?
Roger BeatJesus: É bem como dizem: – Nada se cria, tudo se copia! Para nosso estilo de arte, a ideia de pegar algo já pronto e colocar em outra plataforma e assim alcançar novos públicos, é o segredo que nos trouxe aonde estamos hoje. Pode parecer bobo, esse negocio de recortar, colar e xerocar. Mas, saiba que as grandes revoluções no mundo, começaram justamente através de manifesto escritos, que nada mais é do que fanzines.

Jornal Empoderado – Com a explosão das redes sociais da mesma forma que houve uma alcance e engajamento maior da luta pelas minorias, também houve uma banalização da mesma. Com isto criou-se o senso comum do “textão”, que representa não uma intenção de lutar pelas causas, mas sim, de ganhar repercussão. Isso acaba afetando outros textos que realmente tem a ideia de contextualizar o povo fazendo com que eles percam visibilidade. Como você faz para se afastar desta web banalização das lutas?

Clarice França – Acho que não tem forma de ficar 100% livre de um conteúdo que banaliza as lutas das minorias, até porque às vezes só percebemos depois de certo ponto do “textão”. O que eu busco fazer é seguir sites e influenciadores que conheço o trabalho e confio. Principalmente das minorias em questão, então buscar mulheres pra ler sobre feminismo, pessoas negras para saber sobre racismo, ouvir pessoas trans para o caso de transfobia… Mas fazer esse filtro vai fazer com que a gente caia em alguma coisa ruim.

Roger Beatsjesus – É nitido perceber que a geração Internet não sabe interpretar textos, seja ele textinho ou textão. Tenho feito com a web o mesmo que fiz com a minha televisão: Peguei ela, abrir o portão da rua e deixei ela na calçada. Como dependo da Surface Web para articulações de minhas ações, acesso somente para postagens e recados. Dificilmente fico de tanga passando o dedo na tela e vendo a vida alheia. 

Jornal Empoderado – 3. Quando você sentiu que precisaria usar a sua arte como forma de protesto?

Clarice França – Desde o momento em que entendi o machismo que sofria, e cada vez mais que vejo meu lugar na sociedade como uma mulher bissexual. Eu acredito que desde cedo eu entendi que a arte servia como protesto, talvez por estar rodeada de pessoas que entendiam isso também, mas primeiro precisei passar por um processo de acreditar que eu podia contar histórias, até chegar no ponto em que queria poder usá-las para protestar. Quando se é uma minoria, existe uma barreira inicial, de que precisamos entender que somos tão capazes que qualquer um para fazer arte.

Nos últimos anos essa vontade foi ainda maior, à medida que a onda de ódio vinha ficando mais forte, talvez até pelo crescimento das redes sociais, mais eu pensava como eu poderia fazer as pessoas refletirem de alguma forma com o que eu escrevo.

Roger Beatsjesus – Comecei usar arte como forma de protesto desde quando conheci a arte.Porque o protesto já vem de dentro de mim. Onde eu nasci, minha descendência sofrida do norte da bahia, as injustiças e indiferenças desde o jardim da infancia, não sei fazer outra coisa senão protestar. A arte só me ajudou a criar uma estetica e formatação melhor para apresentar o meu Manifesto. 

Jornal Empoderado – Porque você escolheu este canal para expressar a sua arte?

Clarice França – Escrever é uma paixão que eu tenho desde os 11 anos, desde que comecei a gostar de ler. Então a paixão veio primeiro, depois eu procurei formas de como fazer isso, o que me levou a aprender a fazer roteiros de audiovisual, quadrinhos, etc. Acredito que é a melhor forma que eu tenho de me expressar, com certeza também é a que me deixa mais feliz.

Roger Beatsjesus – Acredite se quiser, mas foi ele (fanzine) que me escolheu, rs. Eu tinha a necessidade de comunicar algo de uma maneira que as pessoas parasse em meio ao caos, e lesse a mensagem. Fazia informativos e revisitinhas com recorte de papel. já que eu não tinha computador e depois xerocava porque não iria fazer uma a uma, até que alguém me falou: – Legal esses seus fanzines! E eu..: – Fanzini ?!?! … 

Jornal Empoderado – Qual a importância da HQ como forma de protesto?

Clarice França – Histórias em Quadrinhos têm um grande público, basta ver o alcance e a quantidade de fãs que temos no nicho de heróis, ou o público que os filmes da Marvel alcança. É uma forma de que as nossas mensagens chegam em todo o tipo de público, de uma forma que pode até ser considerada mais “simples”, além de que a pessoa pode até se identificar com a mensagem.

O mercado brasileiro de quadrinhos têm muito a oferecer, nós temos ótimos quadrinistas e um mercado independente que tem feito trabalhos maravilhosos.

Roger Beatsjesus – A idéia de passar uma mensagem de crítica, conscientização ou alerta através dos quadrinhos é um ganho para uma geração inteira. Tanto na questão da narrativa direta no quadro-a-quadro, quanto, pela ilustração da história, consegue dá percepção e entendimento maior do que se fosse lido num livro ou assistido numa TV. Uma HQ Protesto, além de levar o Manifesto a um público (nerd e geek) que geralmente não frequentam movimentos sociais, também facilita na comunicação protestantes, dependendo da HQ, podendo até virá um manual de luta e auto-defesa.

Jornal Empoderado – Qual a principal barreira que ainda temos no mundo dos quadrinhos sobre a discussão deste tema?

Clarice França – O meio dos quadrinhos ainda possui muitas pessoas preconceituosas, que enxergam nossas mensagens de protesto, sobre minoria e política como “mimimi”. Ainda há pessoas muito privilegiadas em certos espaços dando as ordens, que fazem com que alguns desses assuntos acabem não recebendo a atenção que merecem. Além disso, há obras que são vítimas de grupos de ódio, que as classificam como ruins e não merecedoras exatamente pelos assuntos políticos que levanta.

Jornal Empoderado – Como fazer sua arte chegar nas periferias, população negra, GLBTQ´s e nos mais vulneráveis, que muitas vezes não adquirem sua obra seja por questões econômicas, interesse ou seja por falta de acesso?

Clarice França – Assim como a PerifaCon está fazendo, uma das formas é levar as feiras, o conteúdo e os artistas para mais perto das periferias, com preços acessíveis ou até gratuitamente. Também é preciso fazermos histórias que dialoguem com todos os tipos de pessoas, não só o nerd padrão privilegiado classe média, pois também queremos nos ver e nos identificar com a arte que consumimos. Existem pessoas de todos os tipos, todas elas merecem se verem nas obras da cultura pop.

Eventos e obras inclusivas são duas ferramentas importantes, mas também é legal quando um artista que tem condições pode fornecer seu conteúdo gratuitamente. No meu caso específico, com exceção do Gibi de Menininha, todo o meu conteúdo, ficcional ou não, está disponível de graça no site nebulla.co.

Roger Beatsjesus – Rsrs, acredito que estou fazendo o caminho inverso. Enquanto alguns articulam ações do centro para as periferias, tenho atuado desde sempre na periferia e agora estou seguindo sentido ao centro. A arte impressa dos fanzines sempre foi vista como um tipo de comunicação offline, e eu tenho utilizado esta comunicação para falar com os Povos que não tem acesso fácil as redes virtuais. Através das atividades de recorte, colagem e montagem de Zines, temos não só falado com este grupos, mas também dado a oportunidade de eles mesmo se expressarem através dos fanzines. 

O evento acontece dia 24 de Março, na “Fábrica de Cultura de Cultura do Capão Redondo“,  Rua Bacia de São Francisco, s/n – Conj. Hab. Jardim Sao Bento, São Paulo – SP, 05885-540.

Confira a programação completa no site: https://perifacon.com

Colaboraram na matéria: Anderson Moraes e Augusto Félix.

NOTA

Não deixe de curtir nossas mídias sociais. Fortaleça a mídia negra e periférica

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