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Educação Antirracista

Por  Ana Rosimeri Araujo da Cunha 

Para quem, como eu, é da etnia negra, e foi escolarizada/o nos idos de 1970, o termo educação antirracista, a princípio, poderia passar “batido”, ou em outras palavras, não encontraria eco. Porém, a sólida educação vinda de casa, em que as nossas raízes africanas nunca foram esquecidas, e que, por exemplo, de forma emocionada se encontravam, nos episódios de um seriado antigo, “Raízes (USA, 1977)”. Quanta dor… quantas despedidas abruptas, quanta violação de todo e quaisquer direitos, quantos corpos massacrados…

Um tempo em que se dizia que o Brasil não era racista (ainda insistem nisto até hoje), mas que os americanos eram racistas. Lá, no país da América do Norte, os negros passaram por episódios de usarem somente a parte de trás dos assentos dos transportes públicos, no Brasil não. E comparações como esta foram nos cercando, nos dando uma falsa ideia de que em nosso país a situação era muito melhor. 

Entretanto, esta mesma realidade de superação, ainda era emoldurada por escritos, em livros didáticos, de uma gente escrava. De uma gente descendente de Zumbi dos Palmares, em que ele mais era retratado como vilão do que um supremo guerreiro. Sou a herança escolar de uma História que trazia a Princesa Isabel como a maior bem feitora dos “negros escravos”.

Como ouvíamos falar sobre…

Naquela minha época de cursar o antigo 1º Grau, hoje denominado Ensino Fundamental, os negros tinham maior visibilidade nas atividades físicas (como não acompanhar as façanhas no esporte de João do Pulo, atleta brasileiro, medalhista a partir de 1975, nas competições de salto em distância e salto triplo??), no cenário musical. 

 Ana Rosimeri Araujo da CunhaMas esta mesma História, teve dificuldade em divulgar que Nilo Peçanha, foi o primeiro presidente brasileiro descendente de negros, assim como pouco associou Machado de Assis como escritor e negro. Havia uma tentativa de abrandar a etnia, trazendo o termo “mestiço” como algo de melhor valor do que associar à negro. Pois então, ser um estudante há cerca de 40 anos atrás era viver em um lugar onde o racismo não existia, mas os não negros criavam inúmeras estratégias de reforçar um lugar inferior, de não lugar, de não ascensão, de gente escrava que havia se submetido a perder, a ser domesticado (apanhando) e a se acostumar com a inferioridade. 

A cultura antirracista era produzida, geralmente fora dos colégios, das academias estudantis. Foi uma cultura exatamente alinhada à cultura africana: contada. Narrada pelos mais antigos. Que foram nos contando as histórias dos nossos nomes, da valorização das religiões de matrizes africanas, nos mantendo conectadas e conectados com a exuberância da cultura africana. E que foram, pouco a pouco incidindo na mudança de discurso para dentro dos meios estudantis. 

Basta de “povo escravo”!

Assim, temos a primeira grande mudança: os negros não foram povos escravos. Foram escravizados. E isto muda muito a perspectiva do discurso, as consequências das coisas. Que já por si só eram bem ruins, e com a ampla divulgação de que não fomos dóceis á chegada dos escravistas na África: fomos perseguidos, surrupiados, identidades/tribos estraçalhadas, riquezas afanadas, corpos assassinados. 

fonte : ucsfm.com.br/vidas-negras-importam-spotify-cria-playlist-em-apoio-ao-movimento/

Portanto, podemos pensar que aquela história cinematográfica do seriado televisivo tinha sido real o tempo todo, com nossos ancestrais. A educação antirracista vem para reposicionar a História, para comprometer que todos, independentes de raças e etnias, reconheçam o massacre que foi feito tanto em terras africanas e a continuidade deste massacre em terras brasileiras. E no Brasil, a tentativa secular, para reduzir os descendentes negros àquela condição de escravos que foi legalmente finda em 1888. 

Apesar da lei marcar um fim, como se fosse uma norma, a questão sociocultural ainda persiste e de forma muito contundente. Para fora dos muros da escola e da universidade, vê-se, lamentavelmente, diariamente, ações aplicadas com o intuito de subjugar a identidade de uma pessoa porque ela é negra. O tom de pele ainda é imperioso nas decisões e manutenção dos direitos previstos em lei. 

Sim, temos um caminho promissor

Expressões de animosidade para com o/a outro/a, por ser negro, dá-se em quaisquer segmentos sociais, seja de trabalho ou de lazer. E a incidência da prática do racismo está distribuída nas classes sociais, em pessoas com pouco ou mais elevado índice de escolaridade. Sendo assim, o que fazer? 

Há um caminho para buscar ou acreditar na erradicação do racismo. Vamos agora aos exemplos, às evidências de que estamos praticando e já colhendo efeitos de uma educação antirracista, pautadas em lei, em documentos específicos em 2003 e em 2008. Se a minha geração não teve o arcabouço político pedagógico para receber os fatos devidamente, a geração de uma década e meia conta uma história diferente.

Para fora do ambiente escolar, as variadas expressões artísticas possuem representantes afro-descendentes expressivos, os esportes também o tem. Alguns setores de prestação de serviços tem aumentado seu número de colaboradores negros. Sabe-se que a visibilidade auxilia e muito no desenvolvimento da cultura de que as pessoas, na sua diversidade étnica devem ocupar os lugares que puderem ocupar. 

Isto enfatiza que os setores de recursos humanos precisam olhar para os candidatos às vagas eliminando o critério etnia da sua lista de avaliação de aptidão para o cargo. O critério competência deve ser incansavelmente explorado pelos professores às suas turmas, em especial aos estudantes negros. A lógica do passado, de que o negro não sabe/não aprende/é preguiçoso/ só serve par trabalhos braçais, etc., precisa ser superada por quem gerencia os atos educacionais. Uma gestão escolar (em todos os níveis e modalidades) precisa estar alicerçada nas leis da educação antirracista e na efetiva prática destas leis. 

Falar deste povo, do continente africano que foi massacrado, é somente o início. Dar voz e vez; prestigiar a diversidade étnica; valorizar a expressão religiosa; pautar a origem da elaboração de determinados alimentos; reconhecer os episódios racistas como algo a ser combatido por todos, não somente pelos negros, responsabilizando-se pelo que é dito e pelo que é feito; divulgar as histórias infantis e percursos da História em que as/os negros são os personagens principais fazem parte de estratégias de uma educação contemporânea, socialmente necessária e legalmente estabelecida.  

Promover a criticidade em todos, para que possam analisar as esferas da sociedade na busca do cumprimento de relações sociais embasadas na igualdade e equidade, enfim, auxiliar no resgate histórico, no empoderamento dos negros, promover ações tendo o afrodescendente como protagonista da sua história, facilitando o exercício das competências e habilidades dos negros e articulando com os não negros todas estas ações, confirmarão que estamos vivendo de fato, uma educação antirracista.

Quem é Ana Rosimeri Araujo da Cunha ?

Sou professora, Pedagoga da Educação Especial, Pós graduada em Psicopedagogia Clínica e Institucional e Mestre em Educação. Tudo isto para explicar que minha trajetória profissional acontece exclusivamente no campo da educação e com muita ênfase na Educação Especial. Por conta disto, já fui professora de educação infantil, anos iniciais, assessora na SMED/Porto Alegre, coordenadora geral do setor de educação Especial, da mesma SMED e vice-diretora de uma escola especial, entre tantos cargos que já ocupei. Atualmente sou uma pequena empresária, também no ramo da Educação Especial, pois tenho uma empresa- Baobá Educacional- que presta assessoria, consultoria e palestras sobre a temática da Educação Inclusiva.

Contato- baobaeducacional@outlook.com

NOTA

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