Revisão e edição: Tatiana Oliveira Botosso
O Seminário Contra o Fechamento das Oficinas Culturais, promovido pelo vereador João Ananias (PT), foi realizado sexta-feira (03), na Câmara Municipal de São Paulo. O evento teve como objetivo debater sobre o encerramento do Programa de Oficinas Culturais, que oferecia atividades culturais e aulas de formação artística gratuítas para a população paulista.
A atividade contou com a presença dos deputados Federais Juliana Cardoso e Alfredinho (ambos do PT), lideranças culturais, artistas e trabalhadores das Oficinas Culturais.
Na abertura do evento, a deputada Juliana repudiou o cancelamento de uma audiência com e a secretária de Cultura, Economia e Indústria Criativas, Marilia Marton, e questiou a falta de diálogo da pasta com a população.
No dia 04 de maio é celebrado o Dia Nacional dos Trabalhadores da Cultura, que estão em luto, pois o Governo do Estado de São Paulo vem subtraindo espaços importantes e tradicionais da cultura paulista, além de descumprir a correta aplicação orçamentária prevista em lei.
Foram fechadas mais de 14 Oficinas Culturais em todo Estado, na cidade de São Paulo já foram fechados três espaços culturais no último ano, que há 30 anos atendiam a população paulistana:
- Oficina Mário de Andrade (Fechado temporariamente para reforma desde muitos anos)
- Oficina Alfredo Volpi
- Amácio Mazzaropi
As pessoas presentes estavam em clima de luto, por conta do fechamento desses espaços culturais e da demissão em massa de 40 trabalhadores da cultura, que até agora não foram substituídos.
Foram feitas diversas manifestações em repúdio a ausência de escuta da Secretária Marilia Marton, que já agendou diversas reuniões com representantes do movimento de cultura e depois desmarcou em cima da hora.
A justificatia da Secretaria para o encerramento do Programa de Oficinas Culturais, foi a substituição das atividades para realizar uma formação técnica.
Até onde o Seminário apurou essas formações são temerárias, pois, por exemplo, no interior paulista sequer há indústria cultural para absorver tanta mão de obra técnica, ainda mais com essa política que vai na contramão da empregabilidade, fechando espaços culturais. Sem os locais para apresentações e atividades diversas, a nova “mão de obra” não teria sequer onde trabalhar.
A ausência de informação, deixa margem para a desconfiança, além disso, termos como: “literatura” foi substituído por “produção de conteúdo”, “artes visuais” por “design” e assim por diante.
Kelly Santos declamou o poema “Fogo!… Queimaram Palmares, nasceu Canudos”, do piauense Antônio Bispo dos Santos, do Quilombo Saco-curtume, ele era conhecido como Nego Bispo. Segue o poema na íntegra:
Fogo!… Queimaram Palmares, nasceu Canudos
Por Nego Bispo
Fogo!… Queimaram Palmares,
Nasceu Canudos.
Fogo!… Queimaram Canudos,
Nasceu Caldeirões.
Fogo!… Queimaram Caldeirões,
Nasceu Pau de Colher.
Fogo!… Queimaram Pau de Colher…
E nasceram, e nasceram tantas outras comunidades que os vão cansar se continuarem queimando.
Porque mesmo que queimam a escrita,
Não queimarão a oralidade.
Mesmo que queimem os símbolos,
Não queimarão os significados.
Mesmo queimando o nosso povo
Não queimarão a ancestralidade.
Indiara Nicolleti Ramos, que é artista e escritora, relatou que a Oficina Cultural Oswald de Andrade, há 38 anos é o único ateliê de gravuras públicas do Estado de São Paulo. “Provavelmente [este ateliê] é um dos poucos da América do Sul. E o Seminário pede urgente que as prensas, equipamentos e principalmente a memória deste acervo seja resguardada, preservada e transferida para local seguro, público e de acesso público como a FUNARTE, por exemplo”, concluiu Indiara.
Para a editora e artista colombiana Lina Ibanez, ter um espaço como a Oficina Cultural Oswald de Andrade foi fundamental para compreender e se integrar nessa cidade complexa . Ela lamentou o fechamento da Oficina, dizendo que esses espaços são uma identidade cultural do Brasil, onde vive há 10 anos. E disse que desconhece outro espaço semelhante na Colômbia e em outros países da América Latina.
O ator e ativista Murilo Muraah, lembra que o estado de São Paulo recusou o Novo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), que vai destinar R$1,3 bilhão para a Cultura em todo o país. Uma das propostas desse PAC é de criar CEUS da Cultura. Entretanto, o estado de São Paulo será o único do país sem os CEUS da cultura, que atenderiam 54 cidades ampliando as possibilidades de ampliar as atividades culturais e ampliar a mão de obra o setor gerando emprego e renda.
Ao observar o desmonte do pensamento e da fruição artístico-cultural, apresentam-se riscos ainda maiores à sociedade. Pode ser uma transição de um Estado livre promotor do direito à arte, o livre pensamento, a cultura e a cidade em suas relações com a cidadania, memória, dignidade, direito e desenvolvimento do pensamento para uma mecanização utilitária dos grandes produtores comerciais. Rebaixando as potencialidades críticas e emancipatórias da arte ao mero prestador de serviço para um entretenimento na maioria das vezes acrítico.
No artigo Programa de fruição e mediação artístico-cultural: uma proposta de interlocução entre educação e cultura, seu autor: Leonardo Minervini, analisa o usofruto da arte e da cultura. “Fruição artístico-cultural se aproxima do conceito de experiência, sendo pensada como uma maneira de produção de saberes, isto é, processo de significação de algo que acomete o indivíduo e o toca, sensibiliza, comove, incomoda, provoca dor ou alegria, prazer ou sofrimento, proporcionando desenvolvimento cognitivo, afetivo, criativo, corporal, sensível e emocional aos sujeitos para conferir sentido às suas experiências, transformando-as em autoconhecimento e subjetivação.” Leia o artigo completo aqui.
O movimento Fica Oficinas Culturais publicou um release oficial para a imprensa, com o convite para o seminário, que pode ser lido aqui.
Assista o vídeo completo do Seminário Contra o Fechamento das Oficinas Culturais:
