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Direito à moradia: quando o “cumprimento da lei” é desumano

Foto: Pedro Chavedar

Em uma ‘era Bolsonaro’, nota-se o aumento da marginalização de movimentos que, de criminosos, não tem nada. A distorção do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MSTS), por exemplo, é a prova de que o discurso de ódio, baseado em fake news, e respaldado por ideologias higienistas, contaminaram o pensamento popular, fazendo com que a luta por uma moradia digna – direito que é garantido pela Lei 1.888/2008–  seja visto como um movimento criminoso, “esquerdista” e promovido por pessoas que “buscam regalias”.

Mas, você sabe o que é o MSTS, acompanha grupos de movimentos similares, e sabe o que eles defendem?

Fundado em 1997, o movimento de caráter social, político e popular, luta principalmente pelo direito à moradia, reforma urbana e diminuição da desigualdade social. Atualmente presidido por Guilherme Boulos (PSOL), o movimento organiza trabalhadores urbanos a partir do local em que vivem: os bairros periféricos. Segundo informações do site mtst.org, “não é e nem nunca foi uma escolha dos trabalhadores morar nas periferias; ao contrário: o modelo de cidade capitalista é que joga os mais pobres em regiões cada vez mais distantes”.

Ocupações irregulares, ordens de despejo e a desumanização

São muitos os contribuintes para que, em grande maioria, brasileiros não alcancem o sonho da casa própria ou, ao menos, de uma moradia digna. Segundo o índice fipezap, entre 2008 e 2014, o preço do aluguel teve aumento de 97% em São Paulo, e 144% no Rio de Janeiro. Ou seja, mesmo trabalhando muito, esses cidadãos não possuem renda suficiente para financiar um imóvel e, por vezes, nem mesmo para pagar o aluguel, manter as contas mensais, ir ao mercado, etc. O MSTS explica, ainda, que a luta pela moradia é apenas a ponta do iceberg: não ter um lugar para morar – um teto-, representa não ter, também, condições financeiras para a sobrevivência.

Entende-se assim, que não se trata da busca por regalias, moradia fácil, ou “jeitinho brasileiro”. Mas sim, da pobreza, da falta de políticas públicas efetivas e da desigualdade.

É aí, que entra a ação do Estado. Ou falta dela.

Sejam terrenos/construções particulares ou públicas, é da alçada de cada Prefeitura realizar os trâmites legais que envolvem as ocupações. Ou seja, é a GCM que está lá, armada, para retirar moradores considerados ILEGAIS.

Foto: Mariana Acioli / Jardim Planalto

Em Mogi das Cruzes-SP, nesta semana, a demolição de casas teve grande repercussão nas redes sociais. Uma dessas histórias é a de Lisa Maria, de apenas 23 anos, que estava prestes a se mudar para a “casa nova” com o esposo e o filho pequeno. Com o aluguel atrasado há dois meses, juntou, com muito esforço, dinheiro e doações para a construção. Tudo foi demolido, sem aviso prévio, ordem de despejo ou permissão para pegar os materiais que estavam ali dentro. Tudo virou pó. “Não disseram nada. Só chegou e derrubou. Já tínhamos água e luz, tudo bonitinho. Ninguém procurou a gente, entendeu? A Prefeitura não deu assistência ainda, não disseram nada. Nós conseguimos nossa casa com muito suor e ajuda, e vieram derrubando assim, do nada. Não está fácil. Eu tenho uma ordem de despejo do lugar onde estou, e agora não temos nossa casinha para ir”, desabafou a jovem.

A história de Lisa não é a única, como afirma o advogado, ex-vereador e ex-candidato à Prefeitura de Mogi das Cruzes, Rodrigo Valverde. “Cerca de 30 mil pessoas – dos 450 mil habitantes da cidade-  não têm onde morar, não conseguem pagar aluguel, ou vivem de favor com alguém, de forma sub-humana”.

Mogi é uma das maiores cidades do estado e, infelizmente, é inegável a crescente e constante especulação imobiliária – compra ou aquisição de bens imóveis com a finalidade de vendê-los ou alugá-los posteriormente, na expectativa de que seu valor de mercado aumente durante o lapso de tempo decorrido– em torno do município. Além disso, a maior parte do seu território é de preservação ambiental, o que contribui para que movimentos de moradia não obtenham a atenção necessária, ou sucesso em suas reivindicações. Embates entre cidadãos e GCM, por exemplo, são comuns.

 

Qual o papel da Prefeitura e sua atuação nesses casos? 

Para Valverde, “existe um poder de polícia autorizado por lei para que a Prefeitura proteja áreas públicas e áreas de proteção ambiental, ou seja, quando alguém está construindo nessas áreas é possível que a prefeitura exerça seu papel de polícia e use da força para demolir. Quando a pessoa já está morando no imóvel, mesmo que seja uma área proibida, a Prefeitura perde seu poder de polícia e, obrigatoriamente, tem que recorrer ao judiciário que, se assim determinar, com uma possível ordem judicial, concede à Prefeitura autorização para o uso da força”, esclareceu.

Entenda o caso

O que ocorreu ontem (11), em Mogi das Cruzes, no bairro do Jardim Planalto, dividiu opiniões sobre a legalidade e, também, a responsabilidade da gestão do município a respeito dos moradores.

Segundo o ex-vereador, haviam casas ainda em construção. Mas, dentre todas as demolições, pelo menos duas foram de casas já ocupadas por famílias. “As residências já estavam mobiliadas, ainda que de forma humilde, e a família não estava lá. Quando chegaram no local, seus lares já estavam no chão”.

Valverde afirma que esse foi um “enorme erro, e o que se espera agora é que o poder público arque com o aluguel social para essas pessoas até que sejam contempladas por programas habitacionais – programas esses que, após o impeachment da Dilma, acabaram no Brasil -. Mogi das Cruzes não foi contemplado por nenhum programa habitacional depois que o Minha casa, minha vida foi extinto pelo governo Bolsonaro. O governo estadual também extinguiu com a política do CDHU. São momentos tenebrosos”.

Questão jurídica

O Jornal Empoderado entrou em contato com o advogado e consultor jurídico, Cesar Ricardo Augusto que, em nota, esclareceu:

No âmbito jurídico, para que haja uma ordem de despejo, tem que haver um processo em curso e uma determinação do juiz, com sentença transitada em julgado onde não existe mais possibilidade de recursos, isso tanto particular ou público.

Ao meu entendimento, a maneira como essas famílias são despejadas sem uma ordem judicial é ilegal e desumano, ferindo o princípio da dignidade da pessoa humana. Acredito que na maioria das vezes há sim excesso e abuso de autoridade.

Essas pessoas devem procurar seus direitos em relação aos bens materiais destruídos, o órgão público deve realizar um cadastro de moradia para essas famílias, como por exemplo o programa minha casa minha vida que já não existe mais, porém a criação de outro programa nesse sentido seria importante.

Prefeitura de Mogi das Cruzes

Após a grande repercussão nas redes sociais, inclusive por parte de vereadores da cidade, foi publicada uma nota oficial na rede social facebook:

A Prefeitura informa que as demolições realizadas na manhã desta quinta-feira (11/03) no Jardim Aeroporto III foram feitas em imóveis em processo irregular de construção. NÃO HAVIA famílias ocupando as edificações, que ainda não estavam concluídas. Trata-se de área pública de proteção permanente (APP) onde, por lei, edificações não são permitidas (inclusive há um processo administrativo em tramitação pela Secretaria de Verde e Meio Ambiente, relativo à área e às ocupações irregulares)[…] 

Mesmo constatando e com documentos de que não havia ninguém morando nas edificações, a Prefeitura está à disposição para atender toda e qualquer pessoa que porventura tenha se sentida prejudicada, juntamente com a Assistência Social. Confira a nota na íntegra!

*Edição final de Jéssica Almeida
*Foto: Pedro Chavedar

NOTA

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