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Que mundo estamos plantando? Que mundo esperamos colher?

Não, não vou falar de carma, de galardão ou de “aqui se faz. aqui se paga”.
Minha reflexão trata desse paradoxo que me parece cada vez mais esquizofrênico. A gente planta tempestade e quer colher primavera…
Explico.
Recentemente meu celular foi furtado em uma aglomeração de povo que pretendia mobilizar as pessoas para se unirem e lutarem por um mundo melhor.
Sim. Alguns amigos deram esse mesmo sorrisinho sarcástico de “mas é claro que iam te furtar nesse lugar”.
Outros fizeram uma cara de espanto, do tipo “como assim?, como em um momento como este?”
E, provavelmente, tem alguém pensando nesse momento “esses vagabundos ficam roubando as coisas de quem trabalha para ter”.
Obviamente naquele momento eu me senti absolutamente violada, injustiçada e tomada por uma mistura de tristeza e raiva. Me roubaram não só o celular mas a alegria daquele momento.
Mas, cá estou eu, depois de uma semana, com um novo celular…
E, durante este tempo fiquei pensando sobre o assunto e digerindo. Daí esta reflexão.
Em um primeiro momento pensei “Fui furtada. Que droga. Meu celular está com a tela quebrada. Não consertei porque ia custar R$350,00, e achei um absurdo. Colei uma película e vida que segue. Quem roubou não vai nem conseguir vender meu celular. Talvez joguem no chão, no lixo ou eu recupere no achados e perdidos”. Ledo engano. Para onde quer que tenha ido ele não volta mais.
Um sentimento de revolta, tristeza, frustração me invade. Bora bloquear tudo.
Em um segundo momento penso no paradoxo da situação. Uma pessoa do povo, um cidadão, furta uma cidadã, no caso eu, para vender um celular a uma terceira pessoa também cidadã por um valor muito menor, para comprar outra coisa. Sabe-se lá o quê. Meu celular foi dar um rolê…
Mas que coisa insana… Eu paguei muito mais pelo celular e, no final, esse ciclo depreciou completamente o dinheiro suado, fruto de trabalho.
E quais destes personagens são realmente e plenamente cidadãos?
Bem, sempre falo do abismo social, e alguns diriam que “taí o que você defende. Celular para todos. Lá se foi o seu para alguém que não tinha!”
Penso que, provavelmente, quem me furtou tenha um celular, talvez como o meu. Penso que quem comprou, se é que foi vendido, tenha sido furtado também. E aí penso nesse ciclo tenebroso que é alimentado por essa sociedade.
Alimentado como?
Explico.
Na sociedade consumista que vivemos, qualquer pessoa só é pessoa, e até cidadão, se consome, se tem e se mostra ter. Aqueles que não possuem poder aquisitivo nenhum, são os marginalizados totais. Por vezes não contam sequer no CENSO como pessoas.
Depois temos aqueles cujo o poder de compra se restringe ao mais básico possível da sobrevivência, às vezes mal isso. Eles são contados no CENSO, mas não na vida. Não fazem parte dos lugares, são mal vistos quando entram no shopping ou nas lojas, não são vistos pelos outros como cidadãos iguais, mas sim como incômodo ou risco.
Se são pretos pobres, ou como disse Caetano, “quase pretos de tão pobres”, mais incômodos, rechaçados, visto como ameaça, como escória, como intrusos.
Não sei se foi um preto ou um “quase preto de tão pobre” que me furtou. Não me interessa.
Porque o que pensei é que essa sociedade só enxerga ele, e muitos deles, se estiverem com um tênis da moda, daqueles bem caros; com um celular do bom na mão, com uma roupa de grife e quem sabe um carrão. Mas isso meu irmão, só furtando, porque com o salário ou a bolsa família, não vai dar não.
Aí vem eu, toda feliz, classe média, privilegiada sim, e muito. Branca, cis, com pós graduação, pai e mãe graduados, com casa própria (ainda que seja pequena e fora do Rio), e dou mole com meu celular de estatura mediana… Tá pedindo né mana?
Olha, pedindo eu não estava não. Mas, como eu posso querer ter segurança de que nada meu vai ser furtada em um mundo que mede as pessoas pelo que elas tem e não dá oportunidade para todos terem?
Como viver em harmonia quando 1% da população… PRESTA MUITA ATENÇÃO!!! 1% da população MUNDIAL tem metade de todo o capital, de todo dinheiro do mundo.


Sacou que eu, a privilegiada (e sou mesmo, absolutamente consciente disso) estou no mesmo 99% dos que “dividem” a outra metade do bolo??!!! Em que porcentagem está a pessoa que me furtou? E a pessoa que comprou meu celular?Os números dizem que eu sou parte dos 10% mais privilegiados dos 99%. Mas que nestes 10% também estão aquelas pessoas que a gente considera rico. Porque o Luciano Huck, a família Bolsonaro, a Anita e Harison Ford estão nos 1%. Imagina onde estão as 8 pessoas mais ricas do mundo? Vc tem noção do que é isso?
Se 1%, que se esconde direitinho, está com a metade do dinheiro; sei lá quantos porcento tá na faixa dos ricos e famosos, eu estou nos 10%… Quanto sobra para a pessoa que furtou meu celular???
Se a gente pauta a vida pelo que compra, pelas viagens que faz, pelas fotos postadas nas redes sociais e não pela lógica do humano, do amor ao próximo; como a gente quer, mesmo lutando e berrando por um mundo melhor, chegar nesse mundo melhor???
Meu celular foi dar um rolé…. Tomara que alguém consiga usar ele… Sou privilegiada sim e já comprei outro… Mas não tô feliz com o jeito que esse mundo vai…
Não faz sentido esse abismo. Não faz sentido querer colher um mundo melhor se NÓS, TODOS NÓS, ou quase todos, estamos alimentando esse monstro devorador de vidas chamado consumismo, se estamos ajudando a cavar esse abismo onde nós mesmos acabaremos caindo…
Não é só por um celular…

Para saber mais sobre a desigualdade gerada pelo acúmulo de renda, os tais 1% X 99% leia a matéria do link abaixo:
https://www.huffpostbrasil.com/2017/01/16/como-os-super-ricos-aprofundam-a-desigualdade-social-no-mundo_a_21698446/

 

NOTA

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