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Sobre Diversão Offline

No dia 27 de abril eu chegava ao Centro de Eventos São Luís em São Paulo. Minha terceira participação no Diversão Offline (DOFF) e, como sempre, um misto de sentimentos. A possibilidade de rever amigos e amigas, com os quais converso diariamente e divido projetos, sonhos, desejos e afetos, é algo que sempre me deixa feliz. Nessa versão não poderia ser diferente. Mais uma oportunidade de pensar em coisas novas, conversar com o pessoal das editoras, planejar trabalhos legais. Geralmente eu passo o tempo todo andando, conversando, observando reações, barulhos e silêncios.

Mas o que é o Diversão Offline?

Antes de continuar, para você que me acompanha (ou chegou agora), vou explicar  o que é o DOFF.

Trata-se de um evento de jogos analógicos – RPG, Board Games, Card Games – que possui duas edições semestrais por ano. Estes encontros ocorrem respectivamente em São Paulo e no Rio de Janeiro. Um evento bem interessante para contactar produtores e produtoras de conteúdo, entrar em contato com editoras, conhecer pessoas que estão produzindo novos jogos. Obviamente é também um excelente espaço para uma pessoa que produz jogos tirar suas ideias da gaveta e convidar jogadoras e jogadores a experimentar seu produto.

Não é exagero pensar que São Paulo está se consolidando como um cenário interessante para este tipo de evento. Além da faraônica (hiper estimada, mas importante, sem dúvidas) Comic Con Experience, destaco mais dois eventos importantes para os jogadores de RPG: Dungeon Geek e Perifacon. Os dois são eventos gratuitos e espaços seguros para minorias políticas. Prometo publicar sobre novos eventos que acontecem no Brasil e mapear todos. Podem deixar dicas nos comentários.

O DOFF é um evento  pago, porém tem um preço razoável… Mais baratos que alguns outros da mesma linha. Imaginem quanto um pai tira do bolso para levar duas crianças em um dia de evento? O espaço ficou o tempo todo cheio, com pessoas circulando pelos estandes e jogando. Comigo não foi diferente. Vou ao DOFF para alimentar ideias, mas também como fã. Reencontrei minha amiga Eva Andrade, da Aster Editora, no espaço que montou com o Tiago Junges, da editora Coisinha Verde e Marcelo Paschoalin, que escreveu um mar de livros (não é exagero gente o homem escreve demais) da Editora Letra Impressa.

Encontrei com o pessoal da New Order, dessa vez representada pelo gente boa, Carlos Vloet, e com o pessoal da NPC’s. A New Order foi super bem representada, mas confesso, senti falta do Anésio e do Manjuba. Também esbarrei com meu amigo querido do Jogarta, Mateus Buffone, fizemos uma atividade ano passado super legal durante o fim de semana da consciência negra. Também presente a Retropunk, com Fernando Del Angeles Pires, um dos caras mais fofos da cena do RPG, super atencioso. Conversamos sobre um projeto que eu deixei engavetado e que vai ser retomado logo! Ainda nas editoras, encontrei com o Dan Ramos que trabalha na Redbox, o Filipe da Pensamento Coletivo e Silvio da Editora Fábrica.

Outra oportunidade bacana foi o encontro com o Álvaro e o Saladino, escritores de Tormenta que estavam representando a Editora Jambô. A editora está comemorando 20 anos de Tormenta, com várias novidades no cenário. Mais informações vocês podem encontrar aqui.

Antes era tietagem. Agora é encontrar com mais um amigo que o RPG me deu. Meu herói, o aniversariante Rogério Saladino, escritor de Tormenta RPG.

 

(re)Encontros! Mais uma riqueza dos eventos!

Além dos encontros uma coisa bem interessante do evento é a possibilidade de conhecer alguns jogos publicados pelas editoras nacionais. Encontrei novamente com o Julio Matos, autor de  Goddess Save the Queen  jogo escrito escrito em parceria com a Carolina Neves. Nessa oportunidade ele estava no evento conversando com a galera, autografando o livro e acompanhando o prêmio Goblin de Ouro. Tive oportunidade de  jogar o impressionante Arquivos Paranormais do nosso mestre Jorge Valpaços e também de conhecer o jogo para o qual eu contribuí, prestando consultoria –  o belíssimo Áureos, do meu amigo Reynaldo Ooze.

Com Julio Matos, amigo querido escritor, com a Carolina Neves de Goddess Save the Queen

Imagine um lugar para bater papo com as pessoas que você admira, mas só vê pela Web? Pois é! Encontrei minhas as queridas do canal do youtube Nebulla, a Clarice França e a Rebeca Puig. Conversamos muito sobre Capitã Marvel, sobre universo Marvel no cinema, ficção científica, Octavia Butler, Nnedi Okorafor. Um encontro maravilhoso com essas mulheres talentosas! A próxima missão é inserir a Rebeca nos Jogos de RPG! A vai acontecer logo!

Esse encontro que eu vou guardar no coração! Clarice e Rebeca do Canal Nebulla!

 

Sair de Belo Horizonte, depois de uma semana cansativa (a sexta foi de outro mundo…) e ir para São Paulo, gastando grana do meu bolso, não foi só motivado pelo sonho de publicar um jogo de RPG – contos afro futuristas. Afinal, isso é consequência de um trabalho bem feito. O prazer também é estar no evento com meus amigos e amigas, que me inspiram a fazer algo bacana, pessoas que eu admiro profundamente pelo posicionamento de cada uma delas, por suas trajetórias…

Nina Bichara, mente brilhante… Amiga querida

 

 

Quadrinista Germana Viana pessoa maravilhosa!

 

Raphael Lima, Mundos Colidem!
Amores! Thiago Rosa e Eva Andrade!

Esses encontros são importantes para quem produz. Mais ainda para um homem preto como eu.  Encontrar com pessoas lindas (acho um absurdo, mas faltaram mais fotos! Sério!), que estão fazendo trabalhos de alto nível, conversando sobre novas possibilidades de parcerias em seus canais, em novas produções de conteúdo, em novas publicações. Viver tudo isso é muito importante e eu agradeço a cada uma dessas pessoas. vocês são inspiradoras demais!

Mas, nem tudo são flores.

O silêncio, ou afastamento – quando ignoram nossas vozes

O ponto negativo certamente  foi a postura da editora Galápagos. A editora, que está no processo de produção da 5ª edição do sucesso Dungeons and Dragons, possui uma relação distante da comunidade do RPG. Nesse evento convidou para o seu stand uma figura negativa no cenário do RPG, principalmente para minorias políticas. Não é a primeira vez que isso acontece. A editora bancou, em um espaço fechado, uma mesa no formato de arena que contou com a presença de Diogo Braga e Affonso Solano, ambos do sofrível canal Matando Robôs Gigantes (não vai ter link não). Sim. Sofrível pelos  episódios de 2015 sobre futebol feminino e as piruetas retóricas dos machos.  Acho importante lembrar da presença da excelente Anna Schermak, que estava lá também mestrando D&D, mas infelizmente isso fica apagado diante do erro crasso da editora.

Vale lembrar que Solano é aquela figura que eu gostaria de não encontrar em lugar nenhum, devido a sua postura preconceituosa, amplamente transfóbico, machista, racista. Deem uma sacada na foto de perfil do homem branco usando um cocar… bem sintomático. Exagero? Tá lá no canal do cara. O twitter do rapaz vai na mesma linha. Aliás, tem uma reflexão rasa sobre o M’Baku…, uma fala sobre “transmídia” que faz uma relação transfóbica, durante um evento geek no Rio ou ainda todo absurdo envolvendo uma blogueira bacana. Você pode ler o texto aqui e a repercussão no Anticast 198.

A minha amiga Eva Andrade, entre outras tantas pessoas, questionou a postura da editora e a resposta foi aleatória e sem tato nenhum:

Obrigado por levantar esse ponto tão importante. Valores como diversidade, respeito e inclusão são parte da nossa essência. Por isso, sempre buscamos incluir pessoas de diferentes grupos representativos em toda as nossas iniciativas. Precisamos lutar por essas causas, avaliando com cuidado cada caso e buscando o diálogo antes de qualquer outra coisa. Convidamos todos para fazer do Diversão Offline um exemplo de respeito e uma celebração à união das pessoas. Obrigado mais uma vez por sua mensagem e sinta-se sempre à vontade para falar com a gente sobre qualquer preocupação.

A Wizards of the Coast excluiu de suas publicações o nome de Zak S. justamente por se tratar de um homem acusado por várias pessoas de ter uma postura machista, racista, transfóbica. As acusações culminaram na denúncia de sua ex-companheira Mandy Morbid. Sendo assim, a postura da editora brasileira é absurda.

É evidente que pega muito mal a presença de uma figura tão negativa em uma cena que sempre lutou pela inclusão de diferentes grupos. Eu mesmo já passei por várias situações que me fizeram questionar se valia a pena continuar ocupando um espaço que, no fim das contas, é branco demais e heteronormativo demais. A Galápagos acerta na escolha da Schermak, não só por ela ser mulher, mas por ela ser muito boa, mas a escolha de Affonso Solano é um erro absurdo. Falarei da chegada de D&D no Brasil por ser um jogo importante, mas não sei se quero gastar meu dinheiro com uma editora que mostrou não ter tato ou respeito com parte de seu público.

Outro ponto importante. Não sei se a maioria das pessoas que frequentam o Diversão offline se tocaram, mas, pretos e pretas eram minoria. Pessoas trans também. Outras minorias são invisíveis. Vejam as fotos da Arena de D&D. TÃO BRANCOS! Eu sei que ocupo um mundo de brancos, mas estamos aí. As entrevistas do Empoderado mostram isso muito bem. Ainda existem problemas. Existe um elefante branco no meio da sala e eu esperava um interesse em debater o assunto. Houve um avanço importante, mas não ocupamos esse lugar de forma gratuita. Nesse sentido a editora Galápagos não contribuiu para que nossos corpos, nossas ideias, nossos sonhos ocupassem esse lugar de forma segura.

Alguns podem questionar como um evento resolve um problema estrutural? Os parceiros do evento precisam estimular ações antirracistas, por exemplo. Isso deve ser consciente e intencional. A editora Retropunk lançou o jogo Castelo Falkenstein, do meu ídolo Mike Pondsmith, mas o autor, um escritor negro, não esteve presente. Diferente do escritor de Shadow of the Demon Lord, Robert J Schwalb, que esteve presente como atração internacional. Por que um homem branco e não um homem preto, mesmo este sendo um dos maiores nomes do RPG mundial? A reflexão é importante. Talvez até existissem justificativas, mas elas não ficaram evidentes. Vejam, pessoas negras são minorias, mas, diz pra mim a cor das pessoas que estavam ali trabalhando no espaço fazendo a limpeza? Isso é sintomático. E com isso não quero dizer que não há dignidade nestes trabalhos. Mas, a percepção de que somos minoria entre palestrantes de um evento de jogos analógicos, quem promove esse evento precisa construir espaços de reflexão sobre esse e outros temas. E quando uma editora faz o caminho contrário percebo o tamanho do problema no mercado editorial, na construção de conteúdos, que culmina com a escolha da Editora Galápagos, ao vincular sua imagem com alguém que faz declarações repulsivas como esta:

“Uma pena a Marvel ter alterado o Homem-Gorila no filme do Pantera Negra. Um animal MAGNÍFICO e PODEROSO, símbolo de ORGULHO do continente, roubado do simbolismo por uma minoria q ñ deveria ter esta influência.”

Quem promove o evento não tem culpa dessa escolha. Mas, quem promove o evento precisa mostrar para as editoras parceiras, que esse tipo de figura não contribui com a construção de um evento inclusivo.

Esperança: ou a aposta de que nossas ações podem construir um evento mais bacana ainda!

Diversão Offline é um evento feito em diálogo com o público, com as pessoas que constroem conteúdo. Esse diálogo direto precisa ser ainda mais intenso, ainda mais propositivo.

O evento possui acesso mediano, mas pode incluir mais pessoas, de outros grupos. Mas, para isso, é preciso dialogar. A PerifaCon foi um sucesso e serviu para mostrar para muitas pessoas que a periferia produz e consome. A Poc-Con, que acontece em 22 de junho deste ano,  também está sendo pensada para a comunidade LGBTQI+, e tem de tudo para ser mais uma alternativa importante. O Diversão Offline precisa perceber a importância da diversidade e dar um passo além, propondo mais reflexões em suas palestras e  pensando em convidados que tragam essas perspectivas.

No aguardo do Diversão Offline do Rio de Janeiro.

NOTA

Não deixe de curtir nossas mídias sociais. Fortaleça a mídia negra e periférica

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5 respostas

  1. Muito legal a análise Luciano, eu que não tive oportunidade de ir e também tenho o sonho de lançar o meu RPG fico muito feliz de saber um pouquinho como foi lendo esta matéria bem escrita. Uma pergunta pontual: Você sabe dizer quantos participantes tiveram no evento?

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