A cada 4 minutos, uma mulher é vítima de vítima de violência doméstica no Brasil. Com base nos dados do Mapa da Violência contra a Mulher, de 2015, o site da campanha Compromisso e Atitude Pela Lei Maria da Penha, divulgou que acontecem
“4,8 assassinatos a cada 100 mil mulheres, número que coloca o Brasil no 5º lugar no ranking de países nesse tipo de crime. Dos 4.762 assassinatos de mulheres registrados em 2013 no Brasil, 50,3% foram cometidos por familiares, sendo que em 33,2% destes casos, o crime foi praticado pelo parceiro ou ex.”
Isso em 2013…
De fato, vivemos tempos sombrios, em que apesar de todas as lutas e de conquistas como a Lei nº 11.340/2006 – a Lei Maria da Penha –, nos deparamos com eventos que evidenciam a necessidade de discutir, problematizar e questionar a aplicabilidade da legislação referente ao combate da violência doméstica, bem como o alcance social da importância de fazer valer o nosso direito de sermos respeitadas e de estarmos protegidas diante de um agressor.
Recentemente dois casos públicos fizeram vir à tona essa questão. Primeiro, um cantor foi denunciado pela esposa grávida, que após a repercussão do caso, retirou as acusações de agressão. Depois, um ex-goleiro, condenado pelo assassinato de sua ex-namorada (ou amante, como muitos preferem chamá-la), saiu da cadeia devido ao atraso no julgamento do seu recurso. Isso por si só já parece absurdo, entretanto, o que mais espanta é a receptividade que teve por grande parte da sociedade.
Como disse, são estes tempos sombrios. Por um lado, assistimos a uma mulher assustada e acuada pela mídia, tendo, inclusive, a sua sanidade mental questionada. Do outro, um homem que negou a paternidade de uma criança e matou a mãe do seu filho, é posto em liberdade mesmo após ser condenado, e acolhido por parte da sociedade (inclusive por mulheres) que o idolatram e admiram, certamente acreditando que a culpa do crime foi da própria vítima e que ele agiu por impulso…
Vale considerar que os casos de violência doméstica, especialmente no caso da violência conjugal, em geral se arrastam por longos períodos, principalmente porque há uma tendência de o agressor alterar seu comportamento, demonstrando [falso] arrependimento. O envolvimento emocional e afetivo da mulher agredida com o seu algoz, na maioria das vezes, a conduz a um caminho tortuoso e extremamente nocivo, representado pela oscilação entre novos perdões e novas agressões. Além disso, a sensação de frustração, tristeza e a falta de apoio familiar pode potencializar até mesmo o sentimento de culpa.
A culpabilização da vítima, aliás, é muito comum em casos de violência doméstica, até porque, em geral os agressores são “homens de bem”: trabalhadores com renda fixa e alfabetizados. Boa parte deles são sociáveis e acima de qualquer suspeita. Diante desse perfil e considerando o fato de ainda alimentarmos uma mentalidade machista e conservadora, a figura da mulher passa de vítima a causadora da situação de agressão.
É importante lembrar que a violência doméstica está intrinsecamente ligada a uma relação de poder e, em geral, é fruto de relacionamentos pautados na dominação. O poder do homem sobre a mulher faz parte de uma estrutura construída social, histórica e culturalmente, de forma que para muitos, conceber a mulher como uma figura que deve estar subordinada ao poder masculino, é o “normal”, tendo a função de procriação, manutenção da casa e da família e educação dos filhos. Assim, o “ideal” de mulher seria a “bela e recata do lar”.
Apesar de todos os avanços que as mulheres têm conquistado socialmente no que se refere, por exemplo, a sua atuação no mercado de trabalho e em outras instâncias sociais, parece que o fantasma da violência doméstica é um inimigo difícil de derrotar. Diante do que foi aqui apresentado, dos dados demonstrados em inúmeras pesquisas realizadas por institutos oficiais e ONGs que trabalham no apoio a vítimas de violência doméstica, e estando às vésperas de mais um 8 de março, encerro esse texto com o coração apertado e sem o sorriso que é tão característico da minha personalidade.
Hoje, com quase trinta e seis anos e mãe de uma menina, percebo que ser mulher é fazer parte de grupo de risco no Brasil. Temo por mim, por minha filha, por tantas mães, filhas, irmãs, primas, vizinhas e amigas que todos os dias precisam driblar as artimanhas de agressores.
Concluo dedicando este texto a uma dessas mulheres, que hoje luta para se reerguer após um histórico de agressões emocionais e físicas. Saiba que você não está sozinha e que sua luta também é minha!