O Ministério da Defesa de Moçambique confirmou na última semana, mais precisamente na quinta-feira (25/03) através de declaração à imprensa, um ataque armado à vila de Palma no norte do país, em Cabo Delgado. De acordo com os moçambicanos, a comunicação com Palma está apresentando dificuldades. Porém se tem notícias de uma situação de grave crise humanitária na localidade.
O ataque a Palma aconteceu no dia em que o Governo moçambicano e a petrolífera Total anunciaram a retoma gradual das obras do complexo industrial de Afungi, adjacente à citada vila, após reforço das condições de segurança.
Apesar do Ministério da Defesa orientar a população a manter a calma e a vigilância, o medo assola a população. De acordo com a fonte, moradora de Maputo, que cresceu e possui familiares na região de Palma e que por motivos de segurança será chamada nesta matéria de X, há a fuga desesperada e em massa dos moradores desta região.
X contou que a fuga teve início com a chegada de rebeldes armados que invadiram a vila na quarta-feira (24.03) e começaram a disparar. Há relatos de corpos abandonados nas ruas, de adultos e crianças assassinadas. Provocando ainda mais pavor e dor naqueles que tentam fugir pelas ruas de Palma.
O distrito de Palma tem cerca de 52.000 habitantes, a maioria residente vila, e possuindo faixa etária jovem.
De acordo com os relatos, duas agências bancárias foram destruídas, além de outras construções e veículos. Aqueles que estavam distantes de suas famílias durante o ataque, não puderam retornar, ocasionando a separação de inúmeras famílias que fugiram sem alguns de seus membros.
O Conflito
Não se sabe ao certo quantas pessoas desde a última quarta-feira já fugiram da região. O ataque é o mais grave dos últimos anos nos quais grupos insurgentes armados vêm cometendo esse tipo de ação ao Norte do país.
Cabo Delgado tem sido uma região assolada, nos últimos anos, por ataques armados. A violência na região possui números alarmantes que denunciam grave crise humanitária com quase 700 mil deslocados e mais de duas mil mortes. O grupo ‘jihadista’ Estado Islâmico reivindica a autoria de alguns desses ataques acontecidos entre junho de 2019 e novembro de 2020, mas a origem dos ataques continua sob debate. A desigualdade social também é apontada como um dos fatores desses grupos agirem com insurgência e violência no Norte de Moçambique. Para alguns moçambicanos a motivação dos ataques é principalmente econômica já que a região possui grande riqueza mineral. Vale ressaltar que Cabo Delgado, é a província Moçambicana onde avança o maior investimento privado de África para exploração de gás natural.
Em meio a um conflito permeado por fatores históricos, culturais, religiosos, econômicos e políticos, emergem denúncias de violações cometidas contra a população, também por parte do Estado Moçambicano. Cabo Delgado está sob ataque desde outubro de 2017 por esses grupos, sendo recentemente classificado pelas autoridades moçambicanas e internacionais como uma ameaça terrorista.
As Mulheres
A conjuntura conflituosa que obriga famílias a se deslocarem em fuga, deixando suas casas, bens e entes queridos para trás por si só já constitui grave violação e insegurança humanitária para a população. Porém para as mulheres a situação é ainda mais frágil, segundo a agência da ONU para saúde sexual e reprodutiva, Unfpa, em Moçambique as mulheres são as mais atingidas pela violência.
Inúmeras são as expressões de violações de direitos humanos a que as mulheres de Cabo Delgado têm sido expostas. As consequências dessa exposição são vistas, por exemplo, em gravidez indesejada, violência de gênero e mortes causadas por complicações no parto.
Ainda de acordo com dados do Unfpa em Moçambique, mais de 2,5 mil mulheres e meninas necessitam de cuidados vitais em decorrência da brutalidade nos atos de violência sexual.
Em 2020, o Centro de Integridade Pública (CIP), ONG moçambicana, denunciou através da construção de um relatório, abusos sexuais de mulheres em fuga em Cabo Delgado, em troca de ajuda humanitária.
Este relatório questiona ainda um possível silêncio do Governo e das Nações Unidas sobre o assunto. Como consta no documento, de acordo com moradores da Província, em Pemba circulam inúmeros relatos de “favores sexuais” em troca da inclusão dos nomes de meninas e mulheres vulneráveis nas listas de socorro, elaboradas pelas autoridades locais. Ainda conforme o relatório, as denúncias não geram consequências maiores, estimulando o medo e o silêncio das mulheres.
A Anistia Internacional (AI) também apresentou relatório de denúncia sobre a situação em Cabo Delgado.
Intitulado “O que Vi foi a Morte: Crimes de guerra no Cabo Esquecido”, o relatório se baseia em entrevistas com 79 moradores em fuga de 15 comunidades atingidas pelos ataques e denuncia a insegurança humana vivida por aquela população.
O grito de socorro de uma população encurralada entre grupos insurgentes e o Estado, é traduzido nas palavras de X, ditas a mim através de um emocionado áudio por aplicativo de mensagens no último domingo: “Quem sofre mais em situações de conflito, de crise ou calamidade, são as mulheres. Porque é uma situação muito difícil, que não tenho palavras para descrever a dor que tenho em ver essas imagens, em ver as pessoas a sofrerem, né? Existem pessoas desaparecidas, existem pessoas que não foram encontradas. É uma situação complicadíssima. Muito complicada mesmo. é muita dor”
Seja em que parte do mundo estejamos, sob qual cultura vivamos, nós mulheres estamos sempre mais expostas às variadas formas de violência e isso nos uniu e nos une por séculos. A dor da minha “irmã” moçambicana é a minha. Então, gritamos juntas pela não violência. Pela não violência contra as mulheres e pela defesa dos direitos humanos para todos.
Às mulheres de Moçambique, meu respeito e afeto!
Fontes (sites de notícias): Made for Minds, Onu News, Observador e Visão
Imagens cedidas por X