Temos o prazer de entrevistar Alexandre Tavares é jornalista, bacharel em Direito, associado do Corinthians e torcedor da Estação Primeira de Mangueira. Imperdível, confiram!
EMPODERADO: Qual importância de se discutir mídia alternativa?
ALEXANDRE TAVARES: Total. Sobretudo no atual momento político do país, em que o monopólio da comunicação de massa nas mãos de pouquíssimos veículos, acabam por se tornar as únicas fontes de informação da grande maioria das pessoas. No mercado em geral, acredito que tudo aquilo que não tenha pluralidade de opções ou que gere monopólio, tende a ser prejudicial ao consumidor: seja em preço, seja em qualidade. No caso específico da comunicação, o maior problema é a manipulação das notícias conforme os interesses destes conglomerados. Daí a importância de surgirem cada dia mais veículos como o Empoderado, de mídia alternativa e independente, web-radios, web-tvs, etc.
EMPODERADO: A webradio é uma alternativa a radio convencional?
ALEXANDRE TAVARES:Bom, quando falamos em alternativa entendemos algo como ”ou um ou outro”. Acredito que o termo mais adequado seria ‘complementar’. Podem perfeitamente co-existir. Já fiz webradio e o maior desafio ainda para crescer nesta área é a falta de apoio aos projetos. Pra manter uma webradio com qualidade pelo menos semi-profissional são necessários equipamentos adequados, algum dinheiro de manutenção. E patrocinadores, infelizmente, por mais que você tenha um bom conteúdo, só querem anunciar quando você já se tornou grande e com milhares de visualizações. Mas e o apoio necessário pra conseguir chegar neste nível? Este é o dilema. Ainda acho que seja o maior desafio neste nicho importante, a falta de apoio e até de conhecimento das pessoas em geral sobre esta possibilidade de conteúdo. Existem muitas webradios excelentes e totalmente desconhecidas da esmagadora maioria das pessoas.
EMPODERADO: Por que temos tão poucos negros na mídia esportiva?
ALEXANDRE TAVARES:Não só na mídia esportiva. Temos poucos negros em todos os lugares de destaque: na mídia em geral, no judiciário, no legislativo, no executivo, na direção de clubes, na condição de técnicos de futebol, nas universidades (seja como aluno, seja como professor), em posições gerenciais e diretivas de empresas, e por aí afora. Não sou eu que estou inventando e nem com vitimismo, isso é um fato, é matemático, é estatístico. O Brasil é um país que ainda não superou a escravidão. Ainda há um ranço e um racismo velado que talvez demoremos mais 100 anos pra chegarmos num nível menos perverso de desigualdade. Jamelão cantou em 1988, no samba da Mangueira, com muita propriedade: ”Livre do açoite da senzala, preso na miséria da favela”. É isso. Onde tem muito negro é nas favelas, nos guetos. Ganharam a alforria e foram pra onde? Pros morros, fariam o que, iriam pra onde? Existem aqueles que conseguem ser bem-sucedidos, virar um Joaquim Barbosa? Lógico, mas ainda são raras exceções das exceções de um processo lento em que o negro já inicia sua vida mil passos atrás. Todo o resto que temos hoje é só reflexo de como tudo isso começou, e que por mais que muita gente tente jogar pra debaixo do tapete, ainda não terminou. Entre o conceito duvidoso de meritocracia defendido pelos conservadores e o conceito de igualdade de Rui Barbosa, fico com Rui Barbosa: ‘Igualdade é tratar desigualmente os desiguais na medida de suas desigualdades”. É isso.
EMPODERADO: Ainda existe uma resistência em ter negros em posto de comandos em um esporte Onde Rei do futebol é negro. Comente.
ALEXANDRE TAVARES: Sem dúvida. Repito: novamente é algo geral. Nem só na mídia, nem só no futebol. Presidente de clube negro no Brasil, pelo menos nos principais, jamais tivemos. Mesmo diretores, são raros. Atualmente eu não lembro de nenhum, assim de cabeça. Treinadores contando Séries A, B, C e D do futebol brasileiro, talvez não preencham os dedos das duas mãos. Uso sempre o exemplo do Andrade, que foi campeão brasileiro em 2009 com o Flamengo e não teve mais oportunidade em nenhum clube sequer médio do futebol brasileiro.
EMPODERADO: Por que o Cristóvão não deu certo no Corinthians?
ALEXANDRE TAVARES: É um conjunto de fatores. Eu não posso afirmar que foi por racismo. O Cristóvão veio num momento em que seria muito difícil pra qualquer treinador que assumisse o Corinthians: time recém campeão brasileiro totalmente desmanchado pela direção, o peso da responsabilidade de substituir o maior técnico da história do clube, um time mediano em mãos, a falta de respaldo da diretoria. Num primeiro momento eu achei que o Cristóvão estava sendo vítima de algum preconceito sim, principalmente assim que foi anunciado. Achei que as reações, sobretudo nas mídias sociais, eram desproporcionais e incoerentes. Embora a alegação principal da maioria dos que criticavam a contratação de forma mais contundente, fosse o fato dele nunca ter ganho títulos, muitos destes pediam outros nomes que nunca também tinham sido campeões em lugar algum: Fernando Diniz, Sylvinho, Eduardo Baptista, Roger… ou seja, me parecia incoerente. Porém, somados a todos os fatores que citei, o Cristóvão começou a errar demais em substituições, esgotou de vez a paciência da torcida, a direção não deu suporte e foi o fim da linha pra ele.
EMPODERADO: André Luiz é o único dirigente negro aparentemente na América Latina. Ele pode ser o primeiro presidente negro do Corinthians?
ALEXANDRE TAVARES: Que ele pode ser, pode. Se ele vai ser, não sei. Se vai ser candidato também não sei. Se na condição de sócio eu votaria nele, não votaria. Embora o grupo político do Andrés tenha trazido avanços consideráveis dentro e fora do campo de 2007 pra cá, atualmente eu considero que o clube se encontra mergulhado em dívidas assombrosas, com um time de qualidade muito abaixo do que deveria ter, com um nível de transparência de gestão e governança muitíssimo abaixo do aceitável, duas gestões desastrosas dos últimos dois presidentes pertencentes a este grupo: Mário Gobbi e Roberto de Andrade. Então eu não voto em mais nenhum candidato ligado a este grupo político, mesmo sem saber se o candidato deles será o André ou outro. Tenho em mente alguns nomes qualificados que poderiam dirigir o Corinthians hoje, mas prefiro não externar. Acho que chegou o momento da alternância de poder.
EMPODERADO: Por que existe tão poucos negros no Corinthians em sua diretoria e sócios?
ALEXANDRE TAVARES: Novamente a mesma resposta: é um contexto geral, uma realidade geral do país. Como eu acredito que as instituições são células que replicam o que é a nossa sociedade em geral, é o resultado.
EMPODERADO: Comente a mudança de votação do clube. Explique como era e o que mudou e o que esperar o futuro.
ALEXANDRE TAVARES: Há um sistema vigente de eleição dos 200 conselheiros trienais pelo modelo de chapão. O que é isso? Na prática, o presidente do Corinthians eleito elege consigo 200 cadeiras no Conselho. Ou seja, neste modelo o Conselho tem um vício de origem, uma vez que o órgão que deveria ser justamente imparcial e um ente fiscalizador do poder executivo do clube, está atrelado ao presidente e assim não cumpre seu papel de forma plena. O Conselho aprovou uma alteração para que sejam formadas chapas de até 25 candidatos a essas cadeiras, sendo eleitas as oito mais votadas. Será submetida no próximo sábado, 22/10, à Assembléia Geral de Sócios para ser referendada. É muito importante que os sócios do Corinthians referendem esta proposta, vai gerar mais pluralidade de ideias e independência ao Conselho Deliberativo.
EMPODERADO: Carnaval e samba: Mangueira e Portela velhas companheiras?
ALEXANDRE TAVARES: Ah sim, desde sempre! Pioneiras, pavilhões tradicionais e fortes. O grande desafio destas agremiações é conciliar tradição e modernidade. A Mangueira não ganhava um título desde 2002 e a Portela não vence desde 1984… foi uma grande expectativa ver como se sairia o carnavalesco do momento, Paulo Barros, na Portela. E acho que houve um encaixe melhor do que todos esperavam, a Portela não ganhou o carnaval por detalhes e deu Mangueira.
EMPODERADO: Comente este último título da Mangueira.
ALEXANDRE TAVARES: A gente sempre acredita em nossa escola, tem uma expectativa. E a Mangueira sempre se deu bem homenageando personalidades, desta vez foi Maria Bethânia. A grande surpresa foi o trabalho primoroso do nosso jovem carnavalesco Leandro Vieira. No ano de estreia numa escola do peso da Mangueira, já conseguiu o título. Acredito que o Leandro estará entre os três principais carnavalescos da festa nos próximos ano, muito talentoso! De resto, Mangueira, Bahia, Bethânia, Oyá e aquele samba inesquecível… foi emocionante, indescritível ver novamente um desfile da Mangueira daqueles velhos tempos.
EMPODERADO: Como mangueirense, o que imagina do futuro da Portela após o falecimento de seu presidente?
ALEXANDRE TAVARES:Foi uma grande perda. Marcos Falcon foi a maior liderança portelense desde o grande e saudoso Natal. Desejo muita sorte e serenidade à comunidade portelense, sobretudo ao presidente Luís Carlos Magalhães. Luís é um homem do bem, profundo conhecedor de carnaval, grande lutador do samba, da cultura e da Portela. O Falcon deixou uma escola com um bom direcionamento e bem estruturada, a Águia tem totais condições de superar este trauma e lutar novamente pelo título. Muita sorte e meu respeito a todos.
Obrigado ao Empoderado pelo espaço, abraço a todos!