A luta por representatividade feminina foi pauta durante o ano eleitoral. Diversos projetos, assim como o “Representatividade feminina na política“, promovido pelo coletivo Mulheres sem Censura, visam ressaltar a importância de um pleito eleitoral composto por cada vez mais mulheres. Ainda assim, acompanhando as trajetórias dessas mulheres, é eminente o disparate ao que diz respeito oportunidades e investimento financeiro em campanhas de candidatas brancas e de classes B e C, se comparadas às candidatas pretas e, por muitas vezes, periféricas.
Para Letícia Grabriella, candidata a vereadora de São Paulo, a desigualdade histórica no sistema político as
coloca na subrepresentação, isso influencia na baixa visibilidade, falta de recursos financeiros e baixos apoios de peso, consequências cruéis do machismo e do racismo estrutural e institucional no nosso país. “Somos 27% da população brasileira e a gente não ocupa nem 3% no parlamento, sentir isso na pele é muito cruel. Não podemos mais tolerar essas situações, a nossa democracia não está sendo exercida, porque a população não se reflete verdadeiramente nos espaços de poderes e decisões, por isso que as injustiças sociais tem se agravado. A falta de políticas públicas específicas para mulheres, negros, lgbtqia+, periferia e a juventude, essa carência gera desmonte de direitos fundamentais. Temos que construir uma política de mais representatividade, de gente da gente, mais inclusiva e plural, para garantir acessos, dignidade e que combata às desigualdades existentes”, afirmou.
Outra candidata que relatou sentir na pele o machismo enraizado, principalmente no campo político, foi Roseli de Souza, candidata de Mogi das Cruzes. “Senti no eleitorado, principalmente feminino, uma forte resistência em apoiar outra mulher. Durante a campanha, numa feira da cidade, ao entregar meu cartão de candidata, tive como resposta de uma mulher que “mulher não presta”. Como que as mulheres querem ser representadas no legislativo se elas não dão poder a outras mulheres?”, indagou.
Gênero, cor da pele, classe social e IDADE
Lucélia Moura, candidata pela cidade de São Paulo, levantou uma questão necessária e que, infelizmente, pode passar despercebida, já que Câmaras e Prefeituras são ocupadas majoritariamente por homens brancos e mais velhos. Com as mulheres isso é diferente. A idade, segundo Lucélia, é excludente.
“Uma dificuldade que nós temos enquanto mulheres já maduras, é em ter acesso à mídia. Inclusive a mídia dita progressista e alternativa. Eles tem uma preferência pelos nomes mais jovens, aqueles que estão nas redes, os blogueiros e youtubers. Não nos dão espaço de fala nesses campos. O fato de eu ter 53 anos, para eles, significa que eu não posso ser identificada como renovação, ainda que eu tenha uma proposta para a cidade que é moderna, que fala de direitos para todos, de ocupação de territórios sem barreiras. Ainda assim, eu não sou considerada renovação. Simplesmente por não ser mais jovem”, explicou a candidata.
“As eleições têm realmente a vocação de provocar mudança ou elas só referendam preconceitos e desigualdades já enfrentadas pelo povo no dia a dia?”
Lucélia ainda reforça a disparidade em relação ao financiamento público. “Eu concordo plenamente com o financiamento público de campanha mas eu entendo que ele deva servir para democratizar o processo, no entanto, a distribuição da verba privilegia quem já tem mandato, ou seja, os nomes conhecidos e que, na minha opinião, precisam de menos recursos para chegar às pessoas.
Esse momento que é dito como um momento democrático, um momento das expressões, onde todas as pessoas podem se colocar, votar e serem votadas, na realidade, existe um sistema que induz a repetição dos modelos e dos nomes escolhidos ao longo do tempo.
Ainda nesse sentido, a legislação prevê que uma campanha tenha um teto de gastos de até 3 milhões de reais. Considerando nosso povo, quem tem essa quantia em dinheiro para investir? Mas existem aqueles candidatos que têm formas de arrecadação para chegar nesse valor, o que torna a disputa desigual. As leis deveriam reduzir este valor e propiciar uma melhor distribuição de verbas para que realmente todos tivessem o mesmo acesso, e para que estejam nas instâncias de poder, pessoas mais perto da realidade dos brasileiros”, concluiu.