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Desenhando jogos. Construindo possibilidades.

Alex Silva é um cara muito querido. Tem uma proposta sólida com seu jogo de abordagem Old School em uma temática africana, o Khemet. Eu já estava bem interessado em fazer um bate papo com ele e espero que tenha outra oportunidade (volta Quem é Quem no RPG Nacional…) para fazer uma entrevista com ele sobre sua trajetória com o RPG, esse encontro brilhante com a filosofia africana…

Espero que vocês gostem da conversa!

 

 

1. Pergunta direta, pra incomodar mesmo: o que estamos chamando de RPG?

Uma forma “gameficada” de contar histórias de formas coletivas. Acredito muito que é uma derivação direta do próprio ensino de história na África (Griots).

2. Em cima da pergunta anterior, o que estamos chamando de jogo?

Algo com alguma aleatoriedade ou negociação, que envolva sucesso e fracasso, perdas e ganhos e suas consequências, tudo em um ambiente simulado.

3. Regras. elas são importantes para um jogo de RPG/jogo narrativo?

Demais! Elas devem garantir a proposta e imersão que se busca em qualquer RPG, isso não deve estar nas costas do Mestre ou do grupo mas sim nas regras. As regras devem garantir que QUALQUER mestre ou grupo de grupo consiga chegar à proposta do autor do jogo de RPG.

As regras são a mola mestra de você guiar um grupo de pessoas pra sua proposta, existem vários jogos com propostas fantásticas mas as regras não guiam um grupo de estranhos (sim, quando você produz um jogo tem que lembram que um monte de gente que você nunca conheceu irá se sentar e jogar seu jogo) até a proposta em si, isso é um grande ato falho de um jogo. Você pode até não gostar muito de certas escolhas mecânicas ou de regras, isso é algo pessoal, mas o questionamento quando se cria um jogo é se as regras condizem com a proposta do seu jogo ou não, essa pergunta é muito mais importante do que se as pessoas gostaram ou não dessa regra.

4. A impressão que tenho é que alguns cenários, nacionais ou não, emulam uma “fórmula” de sucesso. algo que, inevitavelmente pode cair em algumas incongruências ou até reproduzir opressões em mesas de jogo. Quais os jogos conseguiram romper, ou ao menos, reinventar, essa ideia?

Assim como falo sobre futebol falo sobre RPG, não é experiência de bolha, tudo que o nosso mundo e nossa sociedade dizem e fazem vem pra mesa de jogo e também pro design. A questão é estar atento e saber o que está rolando e se realmente existe ou não uma preocupação em o sistema ou o jogo em si debaterem esses problemas de uma forma que busque solucioná-los. RPGs brasileiros assim como tudo que é produzido no Brasil ainda é de base europeia, mesmo coisas produzidas aqui de forma geral, desde estética até a forma de como pensar o jogo, então temos uma enxurrada de jogos que mesmo sendo bons só reproduzem valores e esquemas com base de matriz europeia ou branco/asiática. Hoje eu vejo um grande esforço do Jorge Valpaços por exemplo em testar situações e outras formas de enxergar tudo em RPG. Mas digo que hoje vejo vários autores no Brasil com essa preocupação essa coisa em questão, de tentar pensar nesses problemas e como isso interfere em suas produções) com essa preocupação, como repensar o jogo aqui no Brasil, como reavaliar os paradigmas e tentar algo que não é novo mas é “nosso”, ir em outras fontes de filosofia e de visão de mundo e buscar lá coisas que eram pra ser de nosso conhecimento e não são.

Vem logo Khemet!!

 

5. Quando está construindo um jogo, qual deveria ser a preocupação de um Game designer?

A preocupação que eu tenho é ter uma proposta e garantir que a regra e a escrita guiem qualquer grupo ou mestre pra proposta sem muita dificuldade, Minha meta é sempre criar algo que não precise do “mas o Mestre pode mudar isso e o jogo fica bom”, minha proposta na criação é que Mestres e Jogadores mudem o sistema de jogo porque são curiosos e querem e não porque não funciona. A meta é essa, é que o corpo de regras e o texto guiem mestres e jogadores de forma tranquila pra proposta do jogo e que se quiserem mudar algo que seja por curiosidade e experimentação.

6. Pensando em jogos de RPG, em jogos narrativos, o que é imersão? Isso é importante para um jogo?

Imersão pra mim é jogar o jogo e sua proposta. Imersão também é ficar desconfortável às vezes. Me lembro que a primeira vez que mestrei Khemet (RPG OSR sobre África antiga) pra um grupo experiente fiquei feliz quando um jogador muito experiente e fã de OSR olhou as “Classes” (Destinos no jogo) e disse “cara, eu tô meio sem chão, parece que tô jogando RPG pela primeira vez porque não conheço nada do que está aqui”, eu acho isso imersão! Acho que o “desconforto” da descoberta é algo que busco, e se eu busco quando ocorre é imersão. É trazer uma informação nova, porque o objetivo desse meu jogo é também esse. Então imersão é quando a proposta do jogo está rolando na mesa de forma tranquila e autêntica.

7. Qual o motivo para a confusão entre regras e diversão? qual a responsabilidade do game designer nesses pontos?

Quanto às regras a responsabilidade é total do game designer! Ele as elabora e explica, se a elaboração ou explicação falharem as regras também falham. Agora sobre diversão é um ponto complicado, não acredito que a diversão seja um dos pilares do RPG, diversão é algo que se almeja em qualquer situação da vida mas nem sempre se tem, o mesmo no RPG. Uma partida chata e monótona de RPG continua sendo RPG. Penso na diversão como o gol no futebol, as pessoas querem o gol, é o ápice, mas uma partida zero a zero continua sendo futebol, a diversão pra mim segue o mesmo caminho no RPG, se as regras deixaram o jogo fluído e isso divertiu o grupo ok, mas se não ok também, às vezes é um tema meio pesado e que realmente não diverte ninguém, tipo um filme de drama ou um documentário muito pesado, você não se diverte mas acha a experiência válida por outros fatores.

8. Quais os jogos, sistemas e livros te inspiram na construção de jogos? E qual a sua indicação para pessoas que querem escrever jogos de RPG?

Minha maior inspiração quanto à jogos de RPG hoje são as primeiras edições de D&D, as dos anos 70 (passando pela White Box e caixa do Holmes) e indo até os anos 80 com  o D&D BECMI. Mas vários OSR atuais me inspiram demais também, como Spears of The Dawn, Castle and Crusades, The Black Hack, Solar Blades & Cosmic Spells, sharp swords & sinister spells, Tagmar, Maze Rats entre outros jogos mais modernos como Fate, Fiasco, 3:16 e por aí. Literatura Sword and Soul de Milton Davis também é infinitamente inspirador, embora tenha lindo mais sobre ele do que seus livros realmente, mas estão na fila e é um tema que quando sobrar um tempinho (ler um livro em inglês é muito cansativo pra mim) eu vou me dedicar mais.

Mas como sou muito pilhado com África como um todo, historiadores e filósofos negros que trabalhem com África numa visão afrocentrada também me inspiram muito, entre esses os principais são Dra Mama Marimba Ani, Molefi Asante e Cheik Anta Diop, esses três autores são minha grande inspiração na produção de jogos e nas temáticas. Eu fico assustado quando estou lendo um livro de história ou filosofia de um dos três e automaticamente surge uma mecânica ou ideia de algum de algum jogo! Mas estou indo com calma, o que abre a última parte da pergunta que me fez, eu aconselho a quem quer criar um jogo de RPG que tenha calma, que leia coisas fora de RPG também, que deixe que o mundo o influencie e que situações reais da vida virem coisas no seu jogo.

Sou novo nesse processo, Khemet é meu primeiro jogo que será publicado e foi muito por acaso, então minhas dicas são bem superficiais porque também tá sendo novo pra mim, sou um professor de história negro, panafricanista e que seu amor a sua raça fez com que uma ideia de jogo surgisse, alguém achou a ideia boa e disse que queria lançar e agora tô aqui tentando te dar alguma dica. Uma delas é converse com quem já criou e publicou jogos de RPG, escute essas pessoas, elas já passaram por isso. Faça playtests, a regra às vezes só faz sentido pra você que escreveu, deixe que outras pessoas leiam.

Divulgue seu jogo sem medo, eu mesmo disponibilizo o texto integral do Khemet por aí sem medo, acho que gera interesse, acho que gera curiosidade, quem achar que vale à pena comprar irá comprar.

Escreva sobre o que quer escrever, mas sempre ouça outras pessoas, mas ouvir não é necessariamente abandonar sua ideia original, é importante se manter firme muitas vezes, sua proposta deve ser mantida, é o seu jogo! Isso é importante lembrar.

NOTA

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