O Empoderado conversou a treinadora Camila, do time feminino de Paraesópolis que jogou a Copa das Favelas 2019.
Je – Boa noite, meu nome é Adrienne e sou do Jornal Empoderado. Estou aqui para perguntar para o time de de vocês, o qual ficou em segundo lugar na competição, como foi a experiência de participar da Taça das Favelas?
Camila: Boa Noite é a Camila. Respondendo as suas perguntas sobre a Taça das Favelas. Primeiramente foi uma experiência ótima para todas nós. A primeira vez com tanta estrutura e com tanta visibilidade.
Je – E chegar na final?
Então, foi uma experiência única, muito legal e muito gratificante.
Je -Imagino a emoção…
Infelizmente não conseguimos ser campeãs, mas só de estar participando… de ter passado pelas 32 favelas (em SP) e estar no Pacaembu é sem palavras.
Je – Vocês estão saindo a pouco de um jogo. Pode nos contar qual foi o resultado e se ainda a final da Taça da Favelas ainda repercute nos resultados do trabalho de vocês?
Mas já passou essa fase e agora nós estamos continuando o trabalho e sobre o jogo de hoje (a final) foi um jogo foi bom e nós conseguimos fazer um trabalho bem feito em campo, tocando a bola, conversando.
Com peças diferentes, já que algumas peças (jogadoras) não vieram, então isso faz muita diferença em campo.
Mas foi muito bom. Pois conseguimos vir para casa com a vitória e isso é muito importante.
Je – O que vocês acharam da participação da seleção brasileira feminina na Copa do Mundo?
Sobre a seleção Brasileira: eu particularmente fiquei muito triste porque eu estava muito confiante mesmo nas meninas…em raça …em vontade… Tanto que não faltou em nenhuma delas pelo que eu vi…e aí veio a derrota e eu fiquei triste com isso.
Mas o que percebo em geral e que as pessoas são muito negativas e colocam muitas críticas no técnico e nas próprias meninas que foram convocadas e eu acho isso muito chato porque se elas estão lá é porque é para elas estarem lá. Então, se “geral” começar a pensar positivo, mandar energia positiva isso ia fazer muita diferença.
Tem muita gente que manda e pensa positivo, mas muita gente que pensa negativo. Que fala muito mal. E eu nao gosto muito disso. Mas nada é por acaso. Aconteceu isso delas serem eliminadas, mas é trabalhar para próxima “Copa do Mundo” e próximos campeonatos que vão ter para representar o Brasil e que elas possam lutar por nós e para que as outras meninas (mais novas) possam chegar aonde elas estão.
Je – Vocês acreditam que participar dessa final pode ter trazer alguma mudança para comunidade onde vocês vivem?
Eu acho que sim. Traz visibilidade para comunidade, mas não chega a ser uma ponte porque por exemplo, a comunidade Paraisópolis é muito grande. Ajuda no futebol, mas no geral eu não vejo muita coisa nao.
A muito o que se fazer na comunidade para melhorar
Je – Qual o maior desafio do time feminino de Paraisópolis?
Eu como técnica o maior desafio é o preconceito. As meninas jogam muito. (Mas tem) tanto preconceito com elas jogadoras, comigo como treinadora. A maior dificuldade é o preconceito.
Je – E como é feito o trabalho de base do time feminino?
Nosso time, a seleção Paraisópolis que disputou a Taça das Favelas a base dele e a “Palmeirinha Paraisópolis”. O Palmeirinha Paraisópolis é um time que existe a 46 anos, mas o feminino somente a 3 anos. Com muita existência nós conseguimos o time. O presidente do Palmeirinha nos ajudam, os diretores ajudam…e dá espaço para gente. Meu pai que no caso é o presidente, mas nosso time é formado pelo Palmeirinha Paraisópolis.
Je – O problema é que ainda existe muito preconceito com o futebol feminino e ele é quase invisível. Aí parece que ele tem que trazer resultado primeiro para depois ser aceito, receber apoio. A visibilidade de terem participado da Taça das Favelas modificou o apoio que essas meninas recebem para jogar futebol?
Quanto a Taça das Favelas a gente ia para os jogos sempre com ajuda do pessoal do Palmeirinha, mas nos nao tinhamos uma visibilidade das outras pessoas. Só teve impacto na vida pessoal de cada uma quando nós fomos para a final e aí o pessoal começou a perguntar, querer ajudar, mas nada concreto e apoiou a gente no dia da Final. Apenas isso!
Je – Em que idade começa a base do Palmeirinha? Vocês têm meninas pequenas jogando?
Menina pequenas não temos, só a partir de 14 anos e são poucas. A maioria das meninas aqui são um pouco mais velhas. Temos um base, mas são na média de 14 anos a 19 anos.
Je – E qual foi o impacto da Taça das Favelas na vida pessoal de cada uma?
Depois da Taça das Favelas vida normal. Tudo continua do mesmo jeito que foi. Existe sim o apoio do Chiquinho(quem e ele?), do Palmerinha e da Associação(qual associação?), mas por fora eu desconheço. E o que nós estamos precisando é de alguém que invista. Que de apoio neste sentido: de investimento. *Não como salário (apenas), mas tem meninas que acham no futebol um escape para vida, para felicidade, para alegria. Que passam dificuldade em casa*.
Como a “Quero” mesmo deu uma entrevista na Globo falando disso. *Pois quantas vezes ela veio para o jogo sem querer vir, porque no (dia) do jogo o Chiquinho ia dar um pão com presunto, depois ia ter um prato de comida.*
Às vezes a gente se junta e cada um da R$10.00 e quem tem mais dá 15.00 r 20.00 para fazer um churrasquinho. E aí faz uma “resenha” e fica ali todo mundo junto. Então essas coisas que fazem a diferença. Então, o que a gente precisa e de investimento. De pessoas que tenham uma cabeça boa, que investe no futebol (feminino) e olhe para nós diferente.
JE – Infelizmente, muitos ainda acreditam que o futebol feminino seja fraco e usam essa desculpa para não apoiá-lo…
Igual você falou aí. As pessoas não acreditam no futebol feminino. Acham fraco. Mas nao e fraco é que não tem investimento.
Se houvesse investimento desde a base… quantas meninas boas nao teem em todas as comunidades, não só aqui no Paraisópolis? Quantas Martas, Cristianes…?
Igual depoimento da Marta. Quantas Martas, Cristianes, Formigas não tem pelo mundo afora? …
Nao sei se vc viu uma entrevista da “Seleção da Bahia” (acho que passou na SporTV) de uma garotinha que entre 600 meninos ela passou. E aí foi na casa dela e ela (menina) mora com 8 pessoas, em um barraco de 2 cômodos. Eles revezam para dormir e avó dela vende amendoim para trazer comida para dentro de casa(um pouco de comida).
Então quantas garotinhas daquelas nao tem nas comunidades tem um futebol lindo no pé, mas que não tem uma alimentação correta e quando tiver grande…sei lá…numa seleção ou em um clube melhor …isso vai fazer falta no organismo dela? Não tem uma educação adequada sabe? Então é este tipo de investimento que estas pessoas que tem uma visão comece a olhar pro ?
Então! Que estas pessoas que tem uma visão comece a olhar para o futebol feminino como sociedade. Restaurar a sociedade. Essas meninas se não se encontram no futebol podem seguir outros caminhos. Nossos somos provocadores de milagre.
É um milagre tirar uma menina das ruas pra ela jogar futebol. E tem muitas ai. Então que essas pessoas comecem a ver por esse lado aí. A ver o futebol feminino como sociedade.
JE – Neste sentido, o futebol feminino se transforma também em uma porta de esperança de ascensão social de muitas crianças…
Tem muitas mulheres inteligentes, muitas garotinhas capacitadas para serem grandes jogadoras, técnicas, grandes auxiliares técnicas, grandes educadoras, ne? Então que as pessoas comecem a investir em cesta básica, em ajuda de custo, e mesmo que seja um pouquinho…um lanche depois do jogo, uma condução, uma roupa, uma chuteira, tudo isso é dinheiro, né? Infelizmente. Dinheiro que tem que ser investido e muita das vezes não tem e é um desafio pra quem está como líder*. Igual no caso do Chiquinho. *Tem várias meninas que nao tem chuteira e ele nao tem alguém (uma loja) para dizer:”eu vou patrocinar sim…se uma menina não tem uma chuteira ou um meião pra treinar eu vou patrocinar, sim”.
Mesmo que o Chiquinho (não tenha esta loja) nós temos uniforme, temos um estrutura boa graças a Deus. Tem uniforme, condução e na medida do possível nós temos uma alimentação depois do jogo, mas tem clube/time que nao tem isso. De verdade!
JE – Não acham que há necessidade de se formar uma base cada vez mais jovem? Tenho alunas de 11 anos que sonham em jogar futebol e não têm time para treinar…
Então Adri… Respondendo sua pergunta se não há necessidade buscar e/ou formar na base de 11 anos, né? Com certeza há esta necessidade. Eu conversando com a Mônica aqui ela falou que as meninas de 11 anos ainda não conseguem falar para o pai e para mãe que querem jogar futebol. O pai não deixa. Entra este sentido de preconceito,né?
Eu conversando aqui com a Mônica eu disse: *”se existe um projeto, se existe um bom profissional ali que dá a cara para bater e que alguém invista neste profissional para ele se dedicar no projeto, muda né? Muda a base, muda a visão dos pais, das mães e da sociedade em geral, né? Porque tudo é uma dedicação, um trabalho árduo e é lento.*
Um bom profissional tem que ter uma formação, tem que ter uma visão boa também, né? Não é só jogar bola lá no meio do campo ou da quadra e “vamos jogar”
JE – Não deixa de ser um trabalho de educação. Mas você acredita que o preconceito que existe ainda com o futebol feminino prejudica esse dialogo, esse contato com a família?
Não…ali não(é) extra campo conversar saber o que está acontecendo com seus atletas, nê? Chegar na mãe e no pai falar sua filha e seu filho eles vão melhorar o comportamento na escola e em casa, por isso tudo por conta do futebol. E por mor que eles (as) têm de jogar o futebol.
Porque o que eu percebo muitas das meninas em geral isso é que algumas não querem ter comprometimento, não gostam de regras. Mas se existe assim um projeto bom, com estrutura…com uniforme, colete tudo bonitinho e depois do treino dá uma maçã, banana, um lanche, um suco…tudo isso atrai essas crianças, esses jovens e esses adolescentes. Porque eles começam a ter outra visão só futebol, ne? Não é várzea. Então por isso que eu falo bastante de investimento. Porque tudo é dinheiro. Infelizmente, hoje, tudo é dinheiro. Então, se alguém investir nesse sentido as coisas mudam e sempre mudam pra melhor.
JE – Eu agradeço a entrevista que foi muito elucidativa, não só com a situação do futebol em Paraesópolis, mas em relação à situação do futebol feminino no Brasil…
(Eu quero) Agradecer todas as meninas que fazem parte do projeto “Palmeirinha Paraisópolis”, porque muitas deixam muita coisa de lado para jogar futebol e eu acho isso o máximo, um fenômeno