Pensei muito sobre como começar a escrever um bom texto e tive muita dificuldade em conseguir organizar um relato escrito deste sábado no Pacaembu, não pelo fato da técnica de escrita ou a coerência semântica da língua portuguesa, afinal pouco me importa algumas regras gramaticais!
Mas a dificuldade nasce no desejo em passar ao papel emoções em um lugar que foi erguido para o lazer e diversão do público paulistano, porém este estádio sempre ficou distante do povo da periferia, o complexo esportivo do Pacaembu, um lugar histórico, onde cada canto que eu passei neste estádio neste último sábado, me trouxe a memória passagens marcantes da minha vida como torcedor e ontem eu me emocionei novamente ao participar e presenciar da festa popular com o esporte que se tornou popular, graças a luta dos fundadores do time do povo e hoje, este esporte, movimenta cada favela, cada quebrada!
Chegamos (O Anderson e eu) por volta das 10:30 horas da manhã, como sempre ocorreu fomos abordados por um flanelinha, pedindo para “cuidar” do carro, o flanelinha estaria em um ato ilegal? Claro! Porém, será que é imoral? Sei lá…. deixei o veículo aos “cuidados” do cidadão fazendo o pagamento em um intercâmbio financeiro louco, porque eu estava sem dinheiro em espécie, apenas com o cartão, mas no país do jeitinho, para tudo há uma solução!
Logo na entrada, já encontramos uma torcida organizada de uma das quebradas, tiramos foto, cumprimentamos e eles subiram as escadas rumo ao lugar que mais gostam de estar, em uma arquibancada e cantando pelos seus. Entramos no Pacaembu, o Anderson pelo portão 23 e eu pelo portão 16, cada um se posicionou em algum lugar conforme a importância dos fatos, mas confesso, é muito difícil ter esta sensibilidade em um lugar onde a atmosfera estava fantástica, sendo assim, optei pelas arquibancadas.
Rodei do portão principal ao tobogã, passando pelas cadeiras e o que eu mais vi foram famílias, crianças, mulheres, todos, com uma alegria e querendo fazer aquilo que mais gostamos de fazer em um estádio…Torcer! Mas não era torcer pelos jogadores de um clube milionário da capital, a torcida era pelos seus!
Era pelas filhas, irmãs, esposas, mães, primas, para as minas ou pelos filhos, irmãos, maridos, pais, primos, para os manos, o que ocorria ali é o simbolismo da torcida diária pelos invisíveis aos olhos da sociedade, tudo transformado em 90 minutos de futebol, o esporte que imita a vida, a cultura popular, a arte que os brasileiros dominam, porque os nossos grandes jogadores tinham ou tem o gingado e a força do negro, a velocidade dos índios e a resistência da miscigenação dos árabes, portugueses, espanhóis, italianos, japoneses e demais nações que fazem essa salada popular brasileira!
Vamos falar de futebol…
No futebol feminino, o time da Casa Verde venceu o time do Paraisópolis, onde me chamou a atenção de forma positiva, foi a disposição tática dos dois times, cada um bem distribuído em campo e com as suas propostas de jogo bem distintas! O time da Casa Verde jogou com velocidade pelos lados e muita técnica no meio de campo e Paraisópolis tentando entrar pelo meio, onde as meninas eram prontamente bloqueadas pelo sistema defensivo do time da Zona Norte paulistana.
Algo que saltou aos meus olhos é o fato de o futebol de várzea ser totalmente democrático, no time de Paraisópolis, tinham atletas com o físico diferente daquilo que a sociedade trata como um porte físico atlético!
Viva a várzea e a sua democracia! Viva o futebol na sua essência! Viva todas as minas que jogaram a Taça das Favelas! Vocês são campeãs!
No futebol masculino, o time do Parque Santo Antônio venceu por 3 x 2 o time da Favela 1010, o time da zona sul chegou a abrir 3 x 0, mas o time da favela 1010 diminuiu o placar para 3 x 2 e mostrou que a luta pelos seus objetivos, mesmo quando as circunstâncias são contrárias tem que continuar, contra tudo e contra todos!
Para o povo excluído a vitória depende de muita raça, esforço, mas como o futebol imita a vida, no jogo deste sábado, os manos da Favela 1010 lutaram muito, porém perderam a batalha esportiva, isso também faz parte da vida, muitas vezes fazemos o nosso melhor e não conquistamos o nosso objetivo! O jeito é, levantar a cabeça, sacudir a poeira e dar a volta por cima. No gramado do Pacaembu ou na vida, todos os manos são vencedores! Todos os manos que disputaram a Taça das Favelas são campeões!
Ao fim do jogo, o Anderson e eu nos encontramos no portão principal do Pacaembu e na saída da Praça Charles Miller trombamos o torcedor que se veste de Cássio (goleiro do Corinthians), fazendo os seus “corres” pra levantar uma grana, vendia cavalinhos dos grandes times paulistas, sobraram apenas do Palmeiras e São Paulo, falamos do Corinthians e de Corinthianismo, finalizamos cm um dogão e seguimos.
O jogo da vida continuará para cada um que esteve ali no Pacaembu e para os milhões que moram nas quebradas, as dificuldades não se resolveram, o emprego não veio, o patrão não se compadecerá….mas o povo teve o seu dia de alegria e o Jornal Empoderado estava lá, vendo o nosso povo das favelas, os sobreviventes das periferias!
Deixo o meu agradecimento ao jornal Empoderado, seus colaboradores e em especial ao meu amigo Anderson, valeu por me proporcionar uma experiência fantástica!
Final da Taça das Favelas pelos olhos de um dos nossos leitores
Na página do Empoderado tem o álbum completo de fotos da Final. Clique aqui!
Respostas de 2
Fantástico cara, brilhante comentário, acredito que nesse sábado dia 01/06/19 muitos como vc presenciaram um evento de favelas nunca visto ainda, e totalmente voltado para as favelas (Para as Famílias).
TAÇA DAS FAVELAS – O mesmo que oportunidade para as quebradas, precisamos mais disso, muito mais.
Tive a oportunidade de participar dessa primeira edição com a nossa garotada, e o encanto foi e ainda está sendo calculado de tanto que foi.
Acompanhei todas as rodadas no campo da Vila Manchester e no Pelezão.
A chegada de muitas seleções (Favelas), suas emoções, angústias, vibrações e também tristezas, mas essas últimas momentâneas pois a alegria e prazer desses (as) jogadores (as) em participarem dessa Taça das Favelas, ao final das partidas emocionaram a todos presentes.
Essa final então, as palavras do amigo acima ja diz e muito como foi.
Estive presente junto de minha família, amigos, jovens do nosso projeto que participaram da taça, jovens de outros projetos do nosso bairro e muitos convidados.
Ficamos justamente no Tobogã e desculpe o palavrão…..???, que sensação maravilhosa, nunca presenciei isso em um jogo.
Famílias, crianças do Projeto PS9 representadas pelo Complexo Casa Verde chorando com os gols marcados e o título, que fará o sonho delas ainda mais vivo.
Do outro lado a torcida do Paraisópolis a todo momento incentivando e empurrando sua favela, que adrenalina.
Final masculina então, estádio ja totalmente tomado por todas as favelas de Sampa, isso mesmo, todas as quebradas invadiram o Pacaembu para simplesmente se divertirem em família, mas também para voltarem a acreditar que o sonho que tem dentro de cada favela pode e será sim cada vez mais possivel de ser realizado.
Seleção do Parque Santo Antônio jogou demais, e sem modéstia, isso fizeram em todos os jogos dele que presenciei, mas o que a Favela do 1010 conseguiu fazer, principalmente naquela 15 minutos finais foi brilhante e só justificou a existência dessa taça que sem dúvida nenhuma foi e sempre será a TAÇA DAS FAVELAS.
Parabéns mesmo a todos os envolvidos nesse brilhante evento de favelas. Mas em especial ao Celso Athayde que nos proporcionou tudo isso e de forma única e imparcial. Direitos, deveres, lealdalde e oportunidades para todos sem restrições.
Gelson Felix (Facebook)
Favela Brasilãndia (Beija Flor Futebol Masculino)
Z/N São Paulo
Obrigado amigo, o povo sempre responde positivamente quando é visto de forma positiva…
O futebol é nosso, a cidade é nossa, o Pacaembú é nosso…
Resistiremos sempre pelas próximas gerações!
Tamo junto!