Tudo o que entendemos e sentimos sobre racismo é uma construção cultural, social e histórica. O racismo está dentro de mim, de você, das pessoas que você gosta e até das pessoas que te amam, mesmo quando a gente acha que não. Entre as milhares de construções racistas estão as visões estereotipada que temos sobre pessoas negras – fortes, rápidas, sensuais. Olhando por essa perspectiva quero falar sobre privilégio.
A imagem que se tem da pessoa negra periférica, que tem que lutar muito para conseguir a ascensão é tão naturalizada que estranhamos quando percebemos uma pessoa como negra e privilegiada ao mesmo tempo.
O Mundo do Rap por exemplo, teve seu início na arte de um discurso de luta e resistência dessas pessoas marginalizadas. Com sua crescente popularização, tem se disseminado, atingindo novos públicos e discutindo novos temas. Podemos observar essa influência na explosão do Trap na cultura pop.
O ponto é que um artista de Rap que seja negro e privilegiado, muitas vezes, tem seu discurso invalidado independente do conteúdo.
A pergunta que quero levantar é: Por quê?
Essa rejeição é compreensível quando a letra trata de um assunto como a vivência na periferia, vivência esta que uma pessoa privilegiada, mesmo sendo negra, não tem.
Mas isto não a invalida como artista e nem seu discurso relacionado a qualquer outro assunto. Sim, eu acho que essa pessoa tem que ter noção de seu privilégio e respeitar o lugar de fala de quem tem propriedade em assuntos que ele não tem.
Também compreendo que é necessário que o movimento enalteça as pessoas que tem o espaço de fala limitado ou podado. Mas os homens e mulheres negras não devem invalidar ou diminuir seu talento por terem mais ou menos privilégios. Essas pessoas precisam aproveitar ao máximo esta oportunidade, infelizmente, ainda rara na nossa sociedade.
A imagem do negro que sofre para conseguir as coisas é tão marcante na mentalidade geral que quando os negros não cabem nesse esteriótipo, sente não merecer, ou desvalorizam, aquilo que seus pais, seus avós e ancestrais lutaram para lhe deixar como legado.
A herança negra não precisa ser apenas cultural, ela pode vir também em forma de privilégio, e isto não a torna menos merecida. As conquistas também devem ser valorizadas É tão comum ver uma pessoa branca privilegiada que quando se trata de uma negra ela é atacada e assediada por algo que não a torna inferior ou superior a outro negro, apenas, diferente.
Se reconhecer como privilegiado é um passo para se posicionar politicamente.
Porque ao reconhecer que tem privilégios em relação a outros negros, em vez de se posicionar como superior ou inferior a brancos ou negros, essa pessoa pode utilizar isso em favor do todo. Ao mesmo tempo essa consciência faz ele recuar quando o espaço de fala é de um não privilegiado.
Valorizar os espaços e reconhecer esses espaços é algo que soma-se ao talento artístico e não deve subtrair. Reconhecer artisticamente alguém não deve ter relação com sua situação social, mas com seu discurso político.