Maria era lavadeira, arrumadeira, empregada doméstica, passadeira, o que precisar que fosse para poder passar a vida sem passar apertado. Ela tinha quatro filhos:
O mais velho era o Mandela, sempre altivo e austero, defendia os amigos, os irmãos em tudo e mãe achava que seria advogado um dia. O depois dele era Malcolm, com aqueles óculos que marcavam sua característica de intelectual, lia tudo que via, bula do remédio, pedaço de recicláveis no lixão. Seu pai foi assassinado e isto o marcará profundamente.
Agora falaremos do Martin, gostava de ir para a igreja, afinal lá tinha lanche, brincadeiras e todos pareciam muito felizes em cuidar dele.
E finalmente nossa caçula, Marielle, que fazia-se sempre presente em alegrar toda a família com aquele sorriso largo, olhos vibrantes e seu cabelo estonteante.
A vida era muito dura e todos tentavam ser o menos mole possível para conseguir o pão, o arroz, o feijão de cada dia para torna-se sempre nosso.
Contudo, houve um ser pequeno que fez um grande estrago neste lar. Ele devia morar em algum pneu da rua, ou na esquina de trás, ou quem sabe nem morasse lá. Maria estava andando e deu de encontro com este ser. Ela que sempre estava muito atarefada, nem chegou a perceber e…Buumm!! Nos dias que se passaram ficou muito nauseada, com algumas manchas no corpo, tomou tudo que tinha, entretanto, não podia parar, um dia do presente sem trabalhar, era um dia do futuro que estaria sem comer.
Fez que sempre fazia, esperou até o sábado a tarde, foi ao hospital. Seria, ou não seria Dengue, eis a questão. Passou no posto, depois do desgosto da demora de ser atendida, voltou para o posto de mãe e depois de trabalhadora, quando se viu já era o fim,foi deposta, agora da vida.
Antes de ir reuniu os filhos e disse algo que alteraria a trajetória ou na verdade os colocaria na rota certa. Falou-lhes que o mosquito não a matou, porque tão pequeno não haveria de derrubá-la. Maria morria de nó na garganta de tanto silêncio que teve que fazer, de sorrir de canto, de dizer que estava tudo bem, de não poder falar que tinha que ir ao médico, de não contar do repouso, de não falar das dores, as do corpo e principalmente as da alma. Falou que a única herança que deixava era o grito, calado contigo e surdo, que eles tinham que fazer-se escutar. Ir silenciada era ir sem saber que resposta a vida daria para quem não se cala.
Cada um entendeu do jeito que poderia entender e a vida assim foi caminhando. Mandela foi trabalhar e estudar a noite, depois que terminou o ensino médio só pensava em ser advogado. Vivia com pouco dinheiro, devido as prestações da faculdade, e terminava o fim do mês alimentando-se de sonhos.
Malcolm saiu da escola, apesar de ser mais o inteligente da sala, foi usar sua esperteza para vender um pouco de amortecimento dos problemas, em grama, em pó, em folha, cada um tinha sua preferência.
Martin dedicou-se com mais afinco a igreja e seus preceitos, ajudava a quem podia, dedicava-se a caridade aos mais pobres de espírito que o dele, porque financeiramente, todos eram mesmo.
Marielle, foi trabalhar como camelô, todo dia, presenteava a rua, tentando vender mais barato do que perder mercadoria.
Malcolm é preso, e todos os irmãos tentam ajudá-lo da maneira que podem. Martin fala da paz e igualdade, Mandela fala de lutar com armas do estudo e Marielle incentiva com sua franqueza constante e sorriso pleno. Ele rejeita a tudo, estava como um animal ferido e agora enjaulado, não tinha a mente livre das amarras do determinismo, nunca a teve.
Anos se passam…Adultos no corpo, crianças na alma, visto que brincar de sobreviver era a única coisa que tinham feito até ali, foram tomando conta da sua vida, ou melhor do seu grito, sem saber que o que haveria de vir.
Primeiro, Martin, agora pastor, esposo e pai soube o que a senhora Rosa passou. Que alguns jovens a filmaram no ponto de ônibus, a xingaram e riram dela e colocaram nas redes sociais. Ele fez ações junto a comunidade e discursos eloquentes até saírem um domingo e marcharam pela avenida principal para terem visibilidade. Os rapazes disseram que era brincadeira e não precisava tanto alarde. Pediram aquelas desculpas daquele jeito de quem recebe fica mais constrangido do que aliviado. Contudo, Martin resolveu ajudar a outras Rosas em outras comunidades floridas e falar que piadas racistas não tinha a menor graça.
Paralelamente, Mandela ia e voltava para a faculdade. O desemprego dizia que sua qualificação tinha que ser melhor, ao mesmo tempo que sua qualificação não conseguia melhorar sem um emprego. Resolve então participar de um cursinho pré-vestibular para pessoas de baixa renda. No caso dele, pessoas sem renda mesmo.
Malcolm ouve então uma voz, que não clamava no deserto, e sim dentro dos templos. Começa a seguir o ensinamento de alguém que ele via digno, como deveria de ser, quem sabe viu a figura de um pai, ou algo parecido, o segue. Começa a voltar a ler, libertar uma parte da sua mente.
Marielle trabalha de dia, estuda a hora que dá para terminar a faculdade. Muitos vezes sua presença incomoda no campus. Afinal quem podia ser feliz com tão pouco e querer lutar, sem armas, contra o exército de ditadores que murmuravam: você não pertence a este lugar.
Malcolm sai da prisão e resolve libertar seus irmãos de raça. Trazia sua vida como exemplo de quem nunca se viu com importância para a sua comunidade e agora sabia que tinha. Discursava sobre a união, que todos ali eram belos e capazes de serem protagonistas de suas vidas, não mais coadjuvantes, como na televisão. Viver sem acreditar em si já era estar preso nas grades do sistema, entrar na cela, era apenas uma questão de tempo. Arrastava multidões e descobre que seu mentor não era o que parecia dizer, então, rompe com ele, assim em sua testa, vê-se um X, ou melhor um alvo, não foi preciso 80 tiros, resolveu-se com 13.
Depois disso, Martin, ainda consegue levar por mais dois anos a sua comunidade, faz caminhadas, passeatas, pressiona para a mudança de leis e por fim fala de seu grande sonho de um dia ver todos unidos como igual. Sua voz calou-se, precisou de apenas uma bala.
Marielle, forma-se, trabalha como professora e depois candidata-se a vereadora, queria mudar a estrutura machista, racista, homofóbica com seu dom, a franqueza. Apresentou-se, representou, brilhou…Tanto incomodou que apagaram a sua luz, jamais a sua história que ainda hoje está na sua ausência, PRESENTE!
Mandela, conseguiu se formar! Desde a primeira vez que entrou para cursar direito, em todas as indas e vindas, passou-se 27 anos. Essa, foi a sua prisão, quando saiu, era como se toda o mundo conhecesse seu valor, seu trabalho e sua glória. Trabalhava de dia para os ricos, de noite para os pobres e nos fins de semana, como líder comunitário. Foi o único que teve o privilégio de morrer de velhice.
Quantas Maria (s), com seu dom, sua certa magia, tenta alertar seus rebentos a não arrebentarem com as mazelas da vida, para a eles viverem e não apenas aguentarem seu grito silenciado.
Cada um, a seu modo, gritou,como sua mãe nunca poderia ter feito, bem alto, estrondoso e eloquente. Foram calados sim, silenciados jamais! São muitos Malcolm’s, Martins, Mandelas e Marielles no mundo, você pode: escutá-los, apoiá-los, ignorá-los ou gritar também.
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