Conheço o Raphael há um tempo. Acho que foi no momento que construimos o “Quem é quem no RPG nacional” (que volta no mês que vem, se tudo der certo!!). Mas encontrar nossos amigos e amigas ao vivo, depois de tanta interação pela web, pelos nossos grupos no telegram não tem preço! Rapha é um cara que me inspira a pensar no RPG como possibilidade pedagógica, como meio e como fim.Raphael é professor em Natal (salvo engano está ocupando cargo de diretor) é um cara inovador, que está sempre em movimento com o pessoal do Mundos Colidem. Aliás o jogo que ele escreveu, “Crianças Enxeridas” está em pré venda e penso que é mais uma oportunidade legal para conhecer o RPG. Espero que vocês gostem da conversa!
01. Pergunta direta, pra incomodar mesmo: o que estamos chamando de RPG?
Se compartilharmos da mesma ideia, estamos chamando de RPG uma atividade de interação que permite que várias pessoas, de classes sociais diferentes possam construir histórias em uma narrativa interativa.
02. Em cima da pergunta anterior, o que estamos chamando de jogo?
O jogo faz parte da sociedade humana desde os tempos antigos, e correlacionado com a pergunta anterior estamos chamando de jogo o encontro de pessoas, para fugir da realidade para um espaço mítico, onde elas podem viver novas vidas e aventuras, papel esse que só o jogo pode proporcionar.
Raphael e Eu durante o Diversão Offline em São Paulo ano passado
03. elas são importantes para um jogo de RPG/jogo narrativo?
As regras são importantes em qualquer jogo, o fato de ser um jogo onde o jogador tenha mais poder de construção da história, não significa que ele tenha menos regras. Pois até o ato de inserir um elemento narrativo por parte dos participantes, precisa de regras que determinem a construção da história de forma cooperativa e igualitária.
04. A impressão que tenho é que alguns cenários, nacionais ou não, emulam uma “fórmula” de sucesso. algo que, inevitavelmente pode cair em algumas incongruências ou até reproduzir opressões em mesas de jogo. Quais os jogos conseguiram romper, ou ao menos, reinventar, essa ideia?
Estamos vivendo um momento bem conturbado politicamente no Brasil e na América do Sul, e em muitos exemplos, as opressões estão implícitas e em outros, mascaradas dentro do jogo, chegando a passar despercebidas pelo leitor mais desatento. Mas esses jogos que seguem essas chamadas “fórmulas de sucesso” acabam por reproduzir tais opressões estruturadas na nossa sociedade, e ganham vez e voz em grupos que perderam a vergonha de esconder suas vozes intolerantes. Hoje no Brasil, há um pequeno grupo de autores atentos as essas questões e puxando esse debate nos seus jogos: Tiago Junges, Jorge Valpaços, Alan Silva e a Carol Neves, junto com Júlio Matos no Goddess Save the Queen.
Raphael
05. Quando está construindo um jogo, qual deveria ser a preocupação de um Game designer?
O jogo deve ser fluido, as regras alinhadas com a proposta do jogo, e que elas consigam emular bem a proposta. Saudável, pois ele não deve ratificar opressões contra nenhuma minoria social e étnica, esse ponto requer um cuidado redobrado do autor.
06. Pensando em jogos de RPG, em jogos narrativos, o que é imersão? Isso é importante para um jogo?
Em nome dessa tal de imersão já fizeram muita besteira no RPG, mas embora ela seja mais que necessária, tem que se ter uma dosagem onde o jogo não seja frustrante, pois é necessário um equilíbrio entre imersão e diversão. Eu costumo dizer que o jogo precisa ter as duas coisas e não um jogo que só promete imersão sem diversão; quem vai querer jogar? E por que as pessoas jogam? Para se divertir. Então temos que ficar bem atentos a essa dosagem.
07. Qual o motivo para a confusão entre regras e diversão? qual a responsabilidade do game designer nesses pontos?
Não é para existir essa confusão, o game designer já deve contemplar a diversão na construção dos seus jogos. Se há uma confusão, é por excesso de imersão? Ou faltou teste de jogo? Playtest e feedback é essencial nesse ponto, o autor tem que estar aberto a críticas e sugestões. O RPG é um jogo coletivo e suas regras devem contemplar a diversão e a imersão de um grupo de pessoas, não apenas do autor.
Crianças Enxeridas. Jogo do Raphael!
08. Quais os jogos, sistemas e livros te inspiram na construção de jogos? E qual a sua indicação para pessoas que querem escrever jogos de RPG?
Fate e Savage Worlds, por serem muito fáceis de mexer, e por terem muito material, com regras modificadas que permitem compreender as mudanças. E para quem quer escrever jogos, a melhor indicação ainda é a mais antiga, ler e jogar RPG e começar com adaptação de regras. Eu escrevi um artigo no Mundos Colidem chamado “Diário de um Game Designer – Parte 1”, onde falo justamente sobre o início ser em ler e jogar, pois não podemos cair no conto do game designer que não joga, e só leu um sistema.