A razão que motiva escrever sobre o corpo da mulher negra trans é o apagamento simbólico, histórico e assassino desse corpo que busca o direito e a urgência de liberdade. São os recentes eventos que me levam ao mundo trans, uma reflexão sobre paridade, empregabilidade e legitimidade no que se refere aos movimentos identitários e sua pauta reivindicatória. Tenho prestado atenção no que é dito e no modo como digo o que digo, para que o significado deste corpo não pareça vazio e menor.
Os diálogos estão mudando, ainda mais na era da internet, mas ao se referir – LUGAR DE FALA, entendo que cada indivíduo é protagonista da sua própria história, da sua luta. A importância desse conceito nada mais é do que dar espaço e voz pra quem vive e sente a dor do preconceito, abuso ou racismo. É dar voz a quem precisa para que a sociedade possa chegar a uma posição igualitária.
No dia DIA LARANJA, 28 de Janeiro, a ONU BRASIL publicou uma matéria, dando visibilidade a Bruna Benevides, militante e defensora dos direitos humanos da população LGBTI, em especial das pessoas trans e travestis. Coordenadora e articuladora do Instituto Brasileiro Trans de Educação e presidenta do Conselho LGBT de Niterói, vice-presidenta da Rede Nacional de Operadores de Segurança Pública LGBT. Bruna se identifica como “uma mulher trans, identificada pela sociedade como travesti”.
Bruna conta que a população trans e travesti está no foco da violência de gênero, principalmente a partir do momento em que se une ao feminismo. “Quando passamos a empoderar umas às outras, ‘ameaçamos’ o poder hegemônico, do patriarcado, e nos tornamos as primeiras pessoas ‘caçadas’ e violentadas”, explica a militante LGBTI.
Atualmente, o canal “Barraco da Rosa”, conta com mais de 30 mil inscritos. Em seus vídeos, Rosa Luz, mulher negra trans, costuma falar sobre transsexualidade, racismo, questões sociais e culturais, além de compartilhar pedaços de sua vida e suas músicas. Fala do transfeminismo e a exclusão da mulher negra trans e os termos transfóbicos.
Mulher trans é definida como qualquer pessoa que a quem se atribuiu um sexo masculino ao nascimento, mas que se identifica como e/ou vive como uma mulher. Antes de dissertar sobre a inserção da mulher trans na passarela, vamos falar de representatividade, de mulheres trans e negras.
A discussão sobre a representatividade de identidades trans na moda, no teatro, no cinema e na televisão ganha destaque na passarela, na arte, na mídia e na esfera pública. Questiona-se o fato de as subjetividades de travestis e transexuais serem negligenciadas em diversas obras, dando lugar a uma representação estereotipada e preconceituosa, que reforça o gesto de tornar exóticas as pessoas transgênero. Podemos perceber isso nas caricaturas de muitas comédias, estruturadas a partir de um humor transfóbico, ou em dramas moralistas nos quais as figuras trans são sempre subjugadas à prostituição e à marginalidade.
Flávia Almeida, Bacharela em Direito pela Universidade Federal do Pará com foco no estudo das violações de direitos contra a população transexual, diz que existe uma regra: homem e mulher, masculino e feminino, pênis e vagina, só que toda regra possui uma exceção, e essas são, justamente, as pessoas transexuais, que desde cedo, enfrentam uma vida de conflitos.
Falar sobre as experiências da mulher trans negra nos leva a um dialogo sobre invisibilidade e marginalização e na tentativa de trazer o recorte trans para a passarela da moda, percebo que precisamos liberta-la desta corrente de opressão, pois muitas mal possuem condições financeiras de manter a terapia hormonal, quem dirá realizar as intervenções cirúrgicas. Expulsas de casa devido aos atos de violência reiterados, sem escolaridade básica – temos um índice de 73% de evasão escolar por pessoas trans, pois muitas não suportam o ambiente hostil em que estão inseridas.
Falamos hoje de um grupo que é dizimado no Brasil, a média de vida é de 35 anos, elas morrem devido à violência, suicídio ou pelo tratamento errado de fundo de quintal com hormônios.
Como fenômeno social, a questão trans ganha visibilidade, militantes e o crescimento de modelos transgênero nas agências. À medida que nos envolvemos com a moda, somos tentados a esperar que cada desfile seja a representação de cada consumidor possível de imaginar. Questionamos a responsabilidade da moda quanto ao refletir a cultura ou o indivíduo.
Em um mundo bombardeado pela artificialidade das imagens digitais, retocadas por softwares de edição de imagens, o que nos chama atenção é que algumas marcas de moda estão elaborando os castings de suas campanhas com perfis
de indivíduos comuns, orientais, ocidentais, tatuados, deficientes físicos, transgêneros, selecionados após serem observados nas ruas, nos palcos e na internet. O corpo humano é considerado um rascunho, uma matéria-prima de geometria variável, que pode ser redesenhada de uma forma diferente daquela configuração natural. Um objeto de design.
Na esteira da inclusão de modelos transgêneros nos editoriais e na publicidadede moda, a revista Vogue Brasil, de junho de 2013, discutiu os diferentes biótipos representados pela mídia de moda contemporânea em um editorial intitulado Liberdadede escolha, fotografado por Mario Testino.
São incontáveis as vezes em que a pluralidade passou distante no mundo da moda. Hoje, esse cenário ganha novas formas. Um exemplo é o da modelo transexual. Em 2014, ocorreu o concurso Miss Trans Brasil que elegeu no Rio de Janeiro, a candidata de Minas Gerais, Valesca Dominik Ferraz como a mais bela trans do Brasil.
Diversos questionamentos públicos acordaram os estilistas para seus próprios preconceitos inconscientes, que começou com a cota racial, em 2015 quase 32% das modelos nos desfiles de outono em Nova York eram negras. Demorou para chegarmos a este ponto, nos anos 90, a porcentagem era próxima de zero. Aos poucos o leque da diversidade se abriu trazendo diversos corpos, os corpos trans, curvilíneos, amputados, maduros, albinos e outras etnias e biotipos considerados fora do padrão.
Um levantamento feito pelo site FashionSpot, que analisou 236 anúncios feitos nas campanhas da primavera 2016, verificou-se que mulheres trans foram vistas em apenas 0,2% deles. Nas passarelas das Semanas de Moda de Nova York, Paris, Londres e Milão, durante a temporada de outono, elas foram somente 8 das 8.727 modelos que desfilaram.
Peche Di recebeu 15 nãos de agências de modelos até conseguir conseguir participar de uma campanha para uma loja de departamento, a falta de espaço para as modelos trans, trouxe um nicho no mercado. Em Março de 2015, ganhou destaque ao fundar a Trans Models, primeira agência de modelos somente para transsexuais. Peche foi destaque no “The New York Times”, “The Atlantic” e “Vice” e fez parte da lista FORBES Under 30, em 2017. Além de CEO da Trans Models.
Rubi Delafuente, uma mulher transexual tailandesa, em 2017, criou o projeto Trans Missão, em São Paulo, com o objetivo de capacitar pessoas trans e inseri-las no mercado. Mais de 50 homens e mulheres foram agenciados desde então. No currículo da empresa, estão eventos para a Casa Natura Musical, Uber e Vodka Skyy .
A diversidade agora tem sido medida, definida e exigida de tantas maneiras que é quase impossível em um único desfile, um único estilista, atender a todas as exigências. No Theatro São Pedro, Ronaldo Fraga em sua coleção outono/inverno 2017, batizada de “El Dia Que Me Quieras”, uma referência a um espaço criado pelo estilista Ney Galvão, localizado em Itabuna, no interior da Bahia, e que era frequentado pelas travestis da década 70. E no palco do maior evento de moda da América Latina, apenas mulheres trans desfilaram, vestindo peças iguais, mudando apenas as estampas, que foram inspiradas em bonecas de papel.
A moda deixou de ser um interesse de nicho e tornou-se uma fascinação para uma grande camada, uma cultura popular que gera grandes negócios. Todos estão mais envolvidos na produção global das roupas, ocasionando maior impacto sobre todos nós. Onde as modelos são a face e o corpo público dessa indústria, elas respondem pela representação e estabelecem a conexão e o acolhimento dos consumidores no mundo da moda.
Todos querem ocupar espaço na passarela e trazer representatividade ao público que assiste e veste o que lhe representa. Esta (in) visibilidade se dá pelas vozes que geram impactação ao serem ouvidas e antes caladas ou ignoradas. Esse é o papel do Jornal Empoderado, dar voz aos invisíveis.
Respostas de 3
É uma honra e orgulho ter pessoas que fazem o potencial de cada mulher ser demonstrado com admiração por cada ato positivo a ser realizado.. Parabéns pelas pesquisas realizadas descobrindo tantos novos talentos. NÓS SOMOS, NÓS PODEMOS, NÓS VENCEMOS!!!!1
Obrigado, Vania e continue nos acompanhando!
Vânia, fico grata pelo feedback e espero que continue acompanhando meu trabalho e o Jornal Empoderado. Fabiana Silva