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CARA GENTE NEGRA, O QUE PODEMOS APRENDER COM “CARA GENTE BRANCA”?

O Brasil tem um problema sério com o racismo e isso eu já andei falando por aqui. É um país onde apesar do racismo ser crime reconhecido legalmente, quando denunciado ou desnudado, ganha status de mimimi e aqueles que são alvo de agressões racistas e discriminatórias, passam a ser rotulados de vitimistas e ressentidos. É assim na maioria das vezes, até mesmo quando o racismo ultrapassa o limite da raça e alcança a classe, atingindo negros que “teimaram” em ocupar espaços “incomuns”. Basta acompanhar o que se publica nas redes sociais para ver isso.

Bem… se o Brasil tem um problema sério com o racismo, por outro lado, tem uma relação bem peculiar com os EUA, especialmente no que diz respeito à sua produção cinematográfica. Brasileiro adora um filme. Brasileiro adora uma série. E agora, brasileiro adora o Netflix, que traz uma infinidade de filmes e séries, boa parte delas norte-americanas, para nossas telas. Nos últimos dias, uma dessas séries causou o maior furdunço, como diriam lá na Bahia, e veio como um recado bem dado à Cara Gente Branca. Embora tenha como destinatária “a gente branca” estadunidense, a branquitude brasileira deve estar em polvorosa com a repercussão da série, que tem 10 capítulos nessa primeira temporada.

Cara Gente Branca dá um tapa na cara da sociedade norte-americana e a carapuça serve pra nossa branquitude também, especialmente por revelar o racismo que é negado, dissimulado, sutil… tão comum entre nós. Ela chama atenção para o contexto “pós-racial”, como é colocado na série. No caso brasileiro, vejo como uma análise da sociedade que se estabelece no pós-abolição, que mascara o racismo, que transforma o tema num tabu e que alimenta o discurso que isso é coisa de negro que não “se aceita”. A personagem Sam confronta esse discurso e promove o debate através da exposição do modo como “a gente branca” universitária lida com “a gente negra”.

O ponto de partida da discussão é a estereotipação do negro através das black faces, tão comuns entre nós, especialmente durante o período do carnaval. Reforçando a importância de atentar à violência simbólica que há nessa prática, Sam reage a isso afirmando que “minha cor não é fantasia! ”. Em seu programa de rádio, mostra, ainda, o modo como o sistema legitima essa discriminação através de diversas estratégias de controle social, seja no próprio meio acadêmico, pela intimidação da reitoria, ocupada por um negro embranquecido culturalmente; pela repressão da força policial, que rotula e marginaliza o indivíduo negro; ou nos dilemas emocionais que resultam na solidão da mulher negra, que satisfaz os prazeres sexuais, mas não é apropriada para ser companheira, ou, ainda, no conflito para o reconhecimento de uma identidade negra frente ao paradoxo que se instala entre o enfrentamento e a assimilação.

Enfim, Cara Gente Branca, embora direcionado a uma branquitude que prefere enfiar a sujeira do racismo para debaixo do tapete, mostra a cada um de nós, cara gente negra, que a necessidade do enfrentamento. É preciso falar, tão alto quanto possam nos ouvir. É preciso tirar o véu de silenciamento que encobre as mazelas e os efeitos de um passado racista que perdura. Cara gente negra, vamos em frente, porque tem muita gente aí precisando ouvir nossa voz.

NOTA

Não deixe de curtir nossas mídias sociais. Fortaleça a mídia negra e periférica

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